Bruna Nazareth - especial para o Diário
A terapia ocupacional desempenha um papel fundamental na inclusão de pessoas com deficiência na sociedade, seja na escola, no trabalho ou em outras atividades cotidianas. Esse trabalho envolve observar o desempenho da pessoa e ajudar na autonomia e na independência de atividades do dia a dia e o ambiente em que ocorre o desempenho. Beatriz Branquinho, terapeuta ocupacional (UFRJ) e especialista em Saúde Mental (IPUB/UFRJ), destaca que é essencial relacionar a inclusão com o ambiente, que abrange elementos físicos, sociais, culturais, institucionais e econômicos para esse público.
“A escola, tem grande participação no desenvolvimento das crianças e adolescentes, garantindo um espaço adequado com segurança e acessibilidade. O acompanhamento terapêutico ocupacional, visando auxiliar na evolução do desempenho acadêmico de crianças e adolescentes, têm o papel de realizar orientações à equipe pedagógica e corpo docente, incluindo estratégias de Comunicação Aumentativa e Alternativa, sugestão de atividades que estimulem a socialização, e recursos físicos quando adequado para o acompanhamento, como: almofadas de ar no assento e elásticos amarrados à altura das canelas para regulação sensorial, permissão do uso de fidget toys, adaptadores para o uso de riscadores, recursos de tecnologia assistiva, dentre outros”
Logo, o papel do terapeuta ocupacional envolve analisar os fatores que favorecem ou prejudicam o desempenho da pessoa com deficiência em diversas áreas da sociedade, prevenindo lesões e potencializando a participação e incentivando a inclusão em diversos contextos, como: esporte, lazer, brincadeiras e saúde.
Benefícios
De acordo com a especialista, os principais benefícios que uma terapia ocupacional traz é a autonomia, que está ligada ao poder e à liberdade de escolha, a independência, que se enquadra na habilidade de fazer as atividades sozinho, sem suporte de terceiros, e a qualidade de vida de pessoas com deficiência.
“Os treinos de atividades básicas e instrumentais de vida diária são de competência da Terapia Ocupacional, e eles potencializam o ganho de autonomia e independência para uma maior qualidade de vida das pessoas. Eu brinco que o maior objetivo da Terapia Ocupacional é fazer com que as pessoas não precisem mais dela, afinal, a maior conquista é realizar suas ocupações (seu autocuidado e outras responsabilidades do dia a dia) de forma autônoma e independente”, afirma.
Atividades
A realização de atividades lúdicas ou de autocuidado é fundamental no processo de promover a autonomia das pessoas com deficiência. Contudo, as atividades propostas são personalizadas conforme o público e os objetivos de cada paciente.
O maior público da especialista são de crianças que se encontram no Espectro Autista e apresentam dificuldades no processamento sensorial, assim comprometendo sua participação em diversos contextos, como acadêmicos, sociais, de brincar e em atividades de autocuidado. E de adultos com questões de saúde mental das quais impactam em seu desempenho nas atividades cotidianas, seja por quadros de depressão e ansiedade, transtornos mentais, ou até uso de substâncias.
“Como atualmente acompanho crianças neuroatípicas e adultos com questões de saúde mental, as atividades e recursos são variados e adequados para cada caso. Alguns exemplos incluem o explorar de texturas, criação artística, respiração, expressão de emoções, mapa corporal, e ecomapa (recurso que auxilia na percepção dos vínculos atuais, sua intensidade e influência nas ocupações diárias). Além dos treinos das atividades de vida diária, para crianças são também realizadas representações lúdicas na expressão do brincar, a fim de estimular a autonomia através de outras linguagens. Atividades corporais no setting terapêutico de integração sensorial também são ofertadas para que ao longo do acompanhamento as crianças atinjam a regulação sensorial, e participem de suas atividades sem dificuldades”, esclarece.
Modificações em ambientes
Uma função importante do terapeuta ocupacional, pouco conhecida, é a adaptação de ambientes. Para exemplificar, Branquinho compartilha algumas das modificações que já realizou e orienta os familiares a fazerem nas residências, aumentando a independência de pessoas com deficiência.
“Começarei pelas modificações realizadas no banheiro, local com maior risco de quedas: sugestão do uso de piso antiderrapante no box; cadeira adaptada para banho; barras de apoio; torneiras de fácil manuseio; e orientação para aumento em 10 centímetros na base do vaso sanitário. Em outros ambientes, como área de serviço, cozinha, sala e quarto, foi orientado o uso de manivela elevador para o varal de roupas; reorganização espacial da casa a fim de colocar os itens de uso frequente em fácil acesso; evitar o uso de tapetes e móveis baixos, e estimulado o uso de abajur fixo na parede ou mesa de cabeceira. Além disso, recursos visuais como sequenciamento de atividades cotidianas (p. ex: ilustração das etapas do banho plastificadas pregadas no box) também foram prescritos a fim de estimular a independência”
Desafios
A terapeuta observa que ainda há lacunas significativas em diversos contextos quanto à inclusão de pessoas com deficiência, sejam elas educacionais, de lazer, ou em espaços públicos.
“As estratégias têm avançado, porém é necessário que sejam trabalhadas cada vez mais, como exemplo, o sistema educacional, que tem a evoluir e de fato tomar a frente no acompanhamento educacional neuroatípico, bem como espaços desportivos e de lazer devem promover a participação destas crianças e de pessoas com transtornos mentais e/ou dificuldades motoras”
Diante desses exemplos, os terapeutas ocupacionais podem oferecer orientações e promover a educação em saúde para a conscientização, avaliar a acessibilidade desses locais e se envolver em projetos e meios de divulgação direcionados para a inclusão.
A importância do apoio familiar
A participação da família no processo de terapia ocupacional é essencial. Ao considerar as potencialidades e dificuldades de seus entes queridos, eles podem oferecer suporte nos momentos que são, de fato, necessários.
“A família tem o papel importantíssimo de respeitar o processo de conquista de autonomia, assim oportunizando que o cliente realize suas tarefas dentro de suas possibilidades, sem fazê-lo por ele. Além disso, a família pode estimular a continuidade do tratamento em casa, reforçando as atividades feitas na sessão, em casa, a partir da orientação da terapeuta ocupacional. O suporte emocional também tem um lugar importante neste processo, afinal, é importante que a motivação e a autoestima estejam presentes no ato de superação das dificuldades em suas atividades cotidianas”, conclui.
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