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Chuva prevista relembra o cenário da tragédia de 2011

Após 13 anos do ocorrido no Vale do Cuiabá, Petrópolis ainda sofre com alagamentos e deslizamentos oferecendo risco à vida dos moradores

Foto: Arquivo
Foto: Arquivo

Larissa Martins - especial para o Diário

Petrópolis está de sobreaviso devido à previsão de chuvas fortes para este fim de semana. Estão previstos 500 mm até domingo, o que deixou os moradores apreensivos e com medo de que uma nova tragédia aconteça. O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) afirmou que o fato se tornou uma preocupação. O alto número de milímetros previsto para o fim de semana na região liga o alerta para um cenário parecido com 2011, podendo ser ainda mais devastador. Na época, foi registrada a maior tragédia climática da Região Serrana, que atingiu Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo. Os deslizamentos, em conjunto com o transbordamento do Rio Santo Antônio, tiraram a vida de 918 moradores, deixaram 100 desaparecidos e cerca de 30 mil pessoas desabrigadas.

Na cidade, o local mais atingido foi o Vale do Cuiabá, em Itaipava, aonde 72 pessoas vieram a óbito de forma inesperada pelo temporal. Na noite do dia 11 de janeiro, e madrugada do dia seguinte, a chuva fez com que os morros deslizassem, provocando uma avalanche de lama que arrastou tudo que estava a sua frente.

Foram registrados 10 km de destruição deixando mais de mil famílias desabrigadas. Em apenas três horas, o volume de água ultrapassou o esperado para o mês inteiro. Segundo especialistas, em alguns pontos, o índice deve ter ultrapassado 200 mm, podendo ter chegado a 300 mm. Outras cidades nos arredores, como, por exemplo, São José do Vale do Rio Preto e Areal também foram atingidas.

Os petropolitanos não tinham visto algo parecido desde a tragédia de 1988, que matou 134 pessoas na cidade. Diversos bairros foram fortemente afetados. Passadas décadas, o município continua sendo castigado pelos fores temporais. Em 2024 completou 35 anos desde o temporal.

Relato de quem viveu na pele

Cláudia Renata de Almeida Ramos, presidente do Movimento do Aluguel Social e Moradia de Petrópolis e da Comissão das Vítimas das Tragédias da Região Serrana, morava na Estrada de Teresópolis, na altura de Benfica e teve a casa interditada em 2011.

A tragédia socioambiental de 2011 impactou fortemente os bairros do Vale do Cuiabá, Boa Esperança, Madame Machado, Estrada do Gentio, Benfica e Santa Mônica. Até hoje há pessoas desaparecidas e ninguém fala sobre isso. Na época não se teve uma busca grande como nas chuvas de 2022. Minha família foi afetada diretamente, meu primo teve sua casa demolida pelo Inea e ficou aguardando uma unidade Habitacional, porém morreu antes de receber suas chaves por causa de um câncer no pâncreas. Na época, não tivemos tantos suportes como as famílias de 2022. Tivemos a ajuda por poucos meses com uma cesta básica do município e fomos incluídos no aluguel social do Estado de R$500. Mas, muitas doações não chegaram às vítimas, então a maior ajuda que tive para me reerguer e recomeçar foi de amigos e igrejas, conta Cláudia.

Demora na indenização

Segundo ela, devido à demora para a indenização e por falta de fiscalização, muitas famílias desesperadas voltaram para os terrenos que foram interditados. Alguns moradores conseguiram vender os terrenos e foram indenizados Instituto Estadual do Ambiente (Inea). As obras de contenção e recuperação do leito do rio, que são de responsabilidade do Inea, até hoje não foram concluídas. Ela começou em 2012 sendo muito mal feita. Os bairros foram transformados, muitas casas foram construídas a onde nem se tinha residência, comércios grandes se instalaram nesses bairros e hoje posso dizer até que tem muito mais gente do que em 2011. Ainda existem 120 famílias que aguardam suas unidades habitacionais e vivem de aluguel social, afirma.

O Diário entrou em contato com o Inea para saber o porquê de a intervenção não ter sido concluída, e o Instituto informou:

"O Instituto Estadual do Ambiente (Inea) informou que executa obras de controle de inundações, drenagem e recuperação ambiental nos Rios Cuiabá, Carvão e Santo Antônio. O Inea destaca que as intervenções no Cuiabá e Carvão já foram concluídas. No Rio Santo Antônio, restam 10% das execuções para conclusão da obra. Os atrasos na execução de algumas das atividades destas obras decorreram das peculiaridades da intervenção, além dos repasses financeiros, realizados com recurso do Governo Federal. O Instituto também tem monitorado a encosta do Rio Cuiabá, tendo realizado estudos da sua estabilidade, que estão em fase de análises para a elaboração de projeto".

Anos de espera por um teto

Após sete anos esperando por um lar, em 22 de dezembro de 2018, as vítimas receberam apartamentos nos conjuntos habitacionais. Segundo relatos, a localização não favoreceu e até hoje quando chove forte, as famílias ficam ilhadas. Os ônibus não fazem todo o trajeto devido à subida escorregadia. Esses apartamentos foram entregues no Vale do Cuiabá e essas famílias ficaram próximas de seus familiares. O mesmo não aconteceu com outros sobreviventes, que foram encaminhados para o conjunto da Posse, no Córrego Grande, onde é longe de tudo e de todos. Eu também fui contemplada com uma unidade no mesmo lugar. Alguns moradores preferiram os apartamentos do Vicenzo Rivetti por ser mais perto para eles. Foram anos de muita luta e hoje represento 3 mil famílias vítimas das Tragédias socioambientais de Petrópolis desde 2011 até às de 2024 da Pedreira do Ingá, relembra Cláudia.

Cidade da insegurança

Uma das conquistas dela foi a instalação das sirenes no Cuiabá e em Benfica, além do Núcleo de Defesa Civil (NUDECs), que atua com ações de prevenção e orientação as famílias que ainda vivem na região. Mas, ainda há muito o que ser feito.

Em relação ao governo municipal, desde 2011 tentam implantar uma política de Defesa Civil, porém tenho minhas ressalvas. Parabenizo a todos que fazem parte dos NUDECs, pois são voluntários que se dispõem a ajudar as famílias de suas comunidades na hora dos desastres. Infelizmente, só isso não resolve, precisamos ainda fazer com que as famílias de Petrópolis na hora que a sirene toca, quando ela toca, saiam de suas casas e sigam para pontos. É preciso que entendam os riscos da nossa cidade. Temos que fazer com que todos os Petropolitanos entendam e saibam dos riscos da cidade, sem maquiar com essa história de Cidade Imperial para os turistas. Na hora da tragédia não é turista que está aqui, apesar de em 2011 alguns terem morrido por estarem nas pousadas, mas sempre os afetados somos nós das periferias e comunidades. Falta política pública. Só ficar mostrando folders e ganhando medalhas não dá a cidade o status de cidade modelo ou segura, quando na verdade não estamos seguros. Novamente, estamos vendo isso com a previsão de chuvas intensas e o desespero das famílias. Precisamos de um plano de contingência eficaz e eficiente, reforça.

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