COLUNISTA
Olá, sou Douglas Esteves Moutinho e tenho o prazer de anunciar que estou inaugurando hoje essa coluna quinzenal junto ao Diário de Petrópolis. Sou petropolitano, crítico de cinema, autor, criador de conteúdo digital e proprietário do @perfil.cinefilo (instagram). Sou formado em letras pela UFRJ, onde cursei mestrado e hoje estudo no doutorado a relação entre cinema e história. Além disso sou graduado em história pela UCP. Já escrevi um livro e vários artigos acadêmicos sobre cinema, e a partir de hoje compartilharei algumas opiniões e comentários sobre filmes atuais com os leitores do Diário. Todos os filmes comentados estarão disponíveis no Cinema Cine Show do Pátio Petrópolis. Espero que gostem do material e que os ajude a ampliar ou despertar o interesse pelo maravilhoso, amplo e complexo mundo da sétima arte.
Ao longo da história do cinema é notável que certas tendências começam a ganhar visibilidade e logo as suas possibilidades se esgotam. Longlegs se encontra dentro dessa tendência, batizada por alguns otimistas como terror elevado, psicológico ou qualquer outra denominação que vise desqualificar o gênero terror ou horror como algo menor dentro do cinema. O que é ignorado quando tal nomenclatura é utilizada é que o terror sempre possuiu vários exemplos que apresentam abordagem mais ligada ao suspense ou ao psicológico. O que dizer do clássico O Bebê de Rosemary (1968) de Roman Polanski ou O Homem de Palha (1973) de Robin Hardy? Podemos volta ainda mais no tempo e encontrar já nos anos 30 filmes como Vampyr (1932) do sueco Carl Theodor Dreyer, além de inúmeros outros filmes do gênero que se baseiam em uma estética que valoriza a experiência sensorial.
Longlegs é mais um filme com essa premissa, seguindo uma série de filmes alavancados pela semelhança estética e/ou temática com obras de sucesso de M. Night Shyamalan e Rober Eggers. Essa tendência possui como uma grande característica o mistério em torno de seu enredo, e Longlegs não difere nesse aspecto. O argumento do filme é simples: uma agente do FBI (Lee Harker), interpretada por Maika Monroe, investiga um caso de assassinato em sério realizado por um homicida conhecido como Longlegs. As investigações sugerem que o homicida consegue realizar os atos estando ausente dos locais dos crimes, sempre envolvendo uma família com um pai, uma mãe e uma filha. Cabe a Harker desvendar os mistérios em torno desses eventos, travando uma batalha interna e externa entre a razão e o desconhecido. Além de Monroe, Nicolas Cage e Alicia Witt completam o elenco principal.
Dirigido por Oz Perkins, o filme possui uma estética que corrobora a sua proposta. Embora não seja um filme genuinamente inventivo, utiliza bem as ferramentas da fotografia e da montagem para, justamente, trabalhar com o suspense e o mistério que perseguem a protagonista. A iluminação utilizada por Perkins é demarcada, isolando a protagonista geralmente com uma luz sofisticada geralmente dourada. Essa sensação de isolamento é novamente ressaltada pelos enquadramentos e movimentos de câmera rigorosos, frequentemente fixos. Em vários momentos, a câmera de Perkins evita travellings ou movimentos bruscos, como se rejeitasse um maior envolvimento com os eventos por ela captados. Ao invés do movimento, a câmera se aproxima através de zoom ou gira em torno de seu próprio eixo, evitando novamente uma aproximação real com a história. Essas escolhas estéticas do diretor criam uma sensação de enclausuramento da protagonista, que se vê presa e envolta a um evento que nem ela e nem o espectador de início compreende. Perkins, dessa forma, consegue relacionar bem o argumento inicial do filme com a sua estética final, entregando um filme bastante digno.
O cinema contemporâneo nos tem presenteado com diversas histórias que tratam de mulheres bem-sucedidas que, por diversos motivos, são desconhecidas do grande público. Nesse contexto, chega até nós Viúva Clicquot, um filme que narra a história real de Barbe-Nicole Clicquot-Ponsardin, uma viúva de 27 anos que, após a morte do marido, assume a vinícola da família. Com apoio limitado e cercada de homens gananciosos, ela deve lutar para manter a sua filosofia em relação não apenas a vinicultura como também a viticultura.
Com convincente atuação de Haley Bennett e uma fotografia sensível que explora momentos do casal, a natureza e o cenário de época seguidos por uma trilha musical minimalista que conduz o espectador em grande parte do longa, o filme é um convite para uma viagem temporal para a França do início do século XIX.
O filme é apenas o terceiro longa em que Thomas Napper assina a direção. No entanto, Napper possui maior experiência no cinema tendo sido auxiliar de direção de Joe Wright (em Orgulho e Preconceito, Desejo e Reparação e O Destino de uma Nação) e Rob Marshall (em Mary Poppins e Caminhos da Floresta). Talvez essas experiências tenham influenciado Napper na direção desse que é o seu primeiro filme de época.
No entanto, a inspiração de Wright dos anos 2005 e 2007 não passou para Napper em Viúva Clicquot. Embora o filme seja visualmente belíssimo e sensível, ele não consegue em todos os momentos fazer aquilo que o cinema deve por excelência: transmitir algo através de sua linguagem própria, de sua encenação do real. O filme falha justamente quando verbaliza o que não consegue mostrar, fazendo com que diálogos vazios e apelativos até mesmo quebrando a quarta parede ganhem destaque. O cinema é antes de qualquer outra coisa uma arte visual, onde mais importante do que contar uma história é saber encenar essa história através de sua linguagem própria.
Embora o filme apresente essa lacuna, não deixa de ser uma boa obra de época. Para muitos, o principal nesse tipo de cinema é a exploração da própria época. Para esses e aqui me incluo em partes, e para aqueles que buscam um filme com uma abordagem mais poético, Viúva Clicquot cumpre bem o seu papel.
Ambos os filmes se encontram em cartaz no cinema Cine Show no Shopping Pátio Petrópolis.
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