COLUNISTA
Nostalgia, subversão e história do cinema
Os Fantasmas Ainda se Divertem: Bettlejuice Beetlejuice (originalmente Bettlejuice Beetlejuice) é o mais recente filme do renomado diretor Tim Burton, famoso por A Fantástica Fábrica de Chocolate (2005), A Noiva Cadáver (2005), Edward Mãos de Tesoura (1990) e outras obras marcadas pelo tom sombrio, cômico e irônico ao mesmo tempo em que lida com temas mórbidos de forma leve e descontraída.
Apenas três anos depois do longa de estreia do diretor (As Grandes Aventuras de Pee-wee), Burton lança um filme que viria a se tornar um dos seus grandes clássicos e o primeiro longa que carregaria vários elementos estilísticos e temáticos que acompanhariam o diretor ao longo de toda a sua produção: Os Fantasmas se Divertem (1988). Esse longa com Michael Keaton e Winona Ryder nos papéis de destaque introduziram os elementos típicos de Burton já citados, além de revelarem algumas outras características do diretor. Algumas dessas características saltam à vista, como o inventivo uso do stop motion como elemento de sustentação para o macabro, uma vez a técnica “dá vida” ao inanimado, gerando grande sensação de estranheza. Outro elemento trazido por Burton, e esse se relaciona com a própria história do cinema, é a cenografia remetente ao movimento de vanguarda dos anos 20 chamado de Expressionismo Alemão. Esse movimento, fortemente marcado por uma temática sombria, cenografia distorcida e iluminação recortada, abordava temas como o duplo demoníaco, a morte, o sobrenatural, o mítico e doenças psicológicas e se relacionada com a atmosfera depressiva de uma Alemanha destruída após a primeira guerra. Tim Burton se apropriou de várias dessas características para os seus filmes, mas a mais interessante foi a utilização dos cenários distorcidos e pontiagudos à la O Gabinete do Doutor Caligari (1920), clássico de Robert Wiene. Tim Burton usa essa estética cenográfica ao retratar o mundo dos mortos, contrastando-o do mundo dos vivos.
A história do primeiro filme gira em torno de um casal que morre em um acidente e assombra a sua casa para que novos proprietários não vivam lá. A filha do casal que passa a morar na casa, Lydia, é uma paranormal que consegue ter contato com o casal morto e com o anti-herói do filme, Beetlejuice, que se apaixonada por ela. A continuação, lançada 36 anos depois segue a vida de Lydia enquanto ela usa os seus dons levianamente em um programa de TV, lida com a sua filha Astrid (interpretada por Jenna Ortega) e também com as lembranças do ainda presente Beetlejuice.
Tim Burton usa a nostalgia como fio condutor da trama, transportando para o novo filme tudo o que se tornou clássico no primeiro. Enquanto isso possa gerar críticas por parte dos que procuram no filme maior inventividade estética, vejo que a manutenção dessas características fizeram da experiência muito mais interessante. Se em 1988 o stop motion em um filme live-action já causava estranheza, o que dizer dessa técnica usada em uma época em que o cinema é majoritariamente digital? A perseverança de Burton e de sua equipe em manter o estilo original do filme depois de tantos anos é admirável. Além disso, a capacidade do filme de contar uma história sequencial mantendo o elenco original sem que isso parecesse uma tentativa “desnecessária” de uma continuação é também digna. É perceptível o respeito pela obra base, aquela que alçou Burton a um novo nível em Hollywood. Enfim, Os Fantasmas Ainda se Divertem: Bettlejuice Beetlejuice é uma experiência especial para aqueles que são fãs de Burton e ao mesmo tempo um convite para aqueles que não conhecem a obra de 1988 para que a busquem e, quem sabe, cheguem até as referências de Burton no próprio Expressionismo Alemão.
A Menina e o Dragão
A grandiosidade e a limitação de um épico
A Menina e o Dragão (Dragonkeeper) é um filme em animação desenvolvido em coprodução entre a China e a Espanha e se baseia na obra A Guardiã do Dragão, da escritora australiana Carola Wilkison, lançada em 2003. O enredo gira em torno da protagonista Ping e de um dragão imperial aprisionado, Danzi. Eles partem em uma aventura contra o exército imperial onde Ping deve buscar dentro de si o poder para salvar os dragões e mudar o seu mundo.
O filme conta com um premissa interessante, porém não muito bem desenvolvida. Ele flutua entre momentos de ação frenética e momentos mais filosóficos e contemplativos, mas falha em todas as suas tentativas. Para um público acostumado com a excelência técnica padrão da Ghibli, Pixar, Dreamworks, Disney e Cartoon Saloon pode ser difícil acompanhar com real interesse toda a jornada de Ping. Um roteiro não muito bem trabalhado, montagem que pouco cria estímulos e uma trilha sonora extremamente automatizada que em momento algum se conecta realmente às cenas são alguns dos vários problemas do filme, tornando a experiência por vezes penosa para um adulto apreciador do gênero.
No entanto, para o público infantil que naturalmente possui uma visão menos crítica, o contato com uma outra cultura e uma fantasia com elementos próprios e menos evidentes pode ser algo interessante. Vários aspectos da cultura chinesa estão presentes, ainda que alguns não sejam tão evidentes e isso é importante para uma formação com amplitude cultural.
Por fim, buscar em A menina e o Dragão uma obra-prima ou até mesmo um bom filme pode ser decepcionante, mas ainda que o filme possua várias limitações facilmente percebidas, ele ainda pode ser aproveitado por um público mais inocente.
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