Edição anterior (4011):
sábado, 20 de setembro de 2025


Capa 4011
Douglas Moutinho

COLUNISTA

Douglas Moutinho

Demon Slayer: Castelo Infinito

Entre o sublime e o existencial

Foto 1

Demon Slayer: Castelo Infinito é a continuação direta da aclamada série Demon Slayer, retomando a história exatamente de onde a temporada anterior parou. O filme, com quase três horas de duração, impressiona não só pelo tempo de tela raro em animações do gênero , mas também pela profundidade com que desenvolve seus temas. Entretanto, um elemento chama atenção de forma controversa: sua classificação indicativa para maiores de 18 anos. Embora o filme contenha cenas de violência típicas de um shonen, trata-se ainda de uma animação que, mesmo em seus momentos mais intensos, permanece dentro dos limites narrativos e estéticos do gênero. A censura, nesse caso, não se apoia em fundamentos sólidos, mas sim em uma concepção contemporânea de proteção infantojuvenil que carece de embasamento científico e ignora os avanços nos debates sobre o impacto negativo da superproteção no desenvolvimento psicológico.

Curiosamente, é justamente a complexidade temática da obra que mais poderia beneficiar o público jovem. Castelo Infinito não se limita à ação ou ao espetáculo visual que, como sempre, é primoroso , mas mergulha em subtramas que ampliam a narrativa para além do bem contra o mal. O filme reforça valores clássicos do shonen, como coragem, amizade, família e lealdade, mas vai além ao abordar dilemas existenciais com densidade incomum.

O mal, aqui, é absoluto encarnado em Muzan Kibutsuji. No entanto, o que mais assusta não é sua força, mas sua influência sobre os demais. Os demônios que o servem são apresentados, num primeiro momento, como marionetes violentas e letais. Ainda assim, Demon Slayer investe na humanização desses antagonistas ao explorar seus passados. Um desses flashbacks, em especial, possui tal riqueza emocional e narrativa que poderia sustentar um filme próprio, inclusive pela sua duração.

É nesse ponto que o longa atinge sua maior profundidade. Ao investir nas subtramas e nos dramas internos de seus personagens, Castelo Infinito aborda temas como o niilismo, o luto, a morte e a moralidade com maturidade e sensibilidade. A obra transforma personagens secundários em protagonistas momentâneos, sem perder o ritmo ou a coesão narrativa.

O cenário também ganha destaque e se torna parte ativa da narrativa. Controlado pelo Lua Superior Número 4, o Castelo Infinito funciona como um personagem à parte mutável, imprevisível, quase vivo. Seus espaços se transformam à medida que a história avança, mas nunca de forma explícita: as mudanças ocorrem sem anúncio ou explicação, contribuindo para a atmosfera de mistério e desorientação. Essa instabilidade espacial reforça o estado emocional dos personagens e acentua a tensão dramática em cada confronto.

Outro destaque vai para a trilha sonora, que permanece fantástica. A música atua não apenas como complemento, mas como intensificador dramático, alternando-se com momentos de silêncio cuidadosamente inseridos, que amplificam a expectativa, a tensão e o mistério uma escolha que demonstra sofisticação estética e pleno domínio do tempo narrativo.

Demon Slayer: Castelo Infinito reafirma que animes podem, sim, ser veículos legítimos para discutir questões humanas profundas, sem abrir mão do entretenimento. Trata-se de uma animação que combina ação de alto nível, riqueza estética e densidade filosófica, configurando-se como uma das produções mais ambiciosas e bem-executadas do gênero. Sua classificação etária, infelizmente, revela mais sobre os equívocos contemporâneos na regulação de mídia do que sobre o conteúdo da obra em si.


Crítica: Invocação do Mal 4 O Último Ritual

Um legado encerrado entre sustos previsíveis e o peso da própria mitologia

Foto 2
Invocação do Mal 4: O Último Ritual chega com a promessa de encerrar uma das franquias mais populares do terror moderno. Desde 2013, o universo baseado nos arquivos sobrenaturais de Ed e Lorraine Warren, interpretados por Patrick Wilson e Vera Farmiga, cultivou uma base sólida de fãs, misturando jump scares eficientes com um verniz de respeitabilidade histórica e afetiva. No entanto, este quarto e último capítulo se vê preso entre a tentativa de honrar seu legado e a dificuldade em reinventá-lo.

O que mais se destaca neste desfecho não é o terror em si, mas a insistente ênfase em temas familiares em especial a ideia de legado. A narrativa força a continuidade simbólica da missão dos Warren através da filha do casal e seu noivo, deslocando, em diversos momentos, o foco do horror para um drama familiar. A tentativa de humanizar os protagonistas veteranos agora envelhecidos e emocionalmente marcados pelas décadas de confrontos com o sobrenatural é compreensível, mas o equilíbrio entre emoção e medo nem sempre é bem dosado.

Nesse sentido, o filme ecoa não apenas o envelhecimento dos personagens, mas o próprio desgaste da franquia ao longo dos anos. Ao tentar "entregar o melhor" e ainda soar inovador, O Último Ritual acaba revelando justamente a dificuldade de se sustentar criativamente após tantos derivados e expansões. Mas há algo de respeitável em sua tentativa de resgatar a essência original da saga: o medo doméstico, silencioso, centrado em casas assombradas e presenças invisíveis. Nesse retorno ao terror mais íntimo, o filme procura costurar conexões com os primeiros filmes e com o universo estendido dos Warren e consegue.

Contudo, o longa tropeça ao tentar vender uma narrativa maior do que realmente oferece. A distribuição e o marketing apelam para frases de impacto que prometem o "pior caso" enfrentado pelos Warren ou o evento que teria feito o casal abandonar as investigações. Nada disso se concretiza em tela. O confronto com as "entidades misteriosas" nunca alcança a potência das ameaças dos dois primeiros filmes dirigidos, vale lembrar, por James Wan, cuja ausência aqui pesa mais do que nunca.

O filme é indiscutivelmente superior ao morno Invocação do Mal 3, conseguindo oferecer um encerramento mais digno ao casal protagonista. E é nesse ponto que a obra encontra algum valor: na ideia de encerramento e na sensação de dever cumprido.

No fim, O Último Ritual parece menos interessado em aterrorizar do que em concluir. Sua maior assombração não está nos demônios, mas na sombra de si mesmo de uma franquia que cresceu mais do que devia, expandiu-se além da conta e agora tenta, com alguma dignidade, fechar as cortinas. O resultado é um filme que, mesmo sem grandes novidades, entrega o que promete a quem acompanhou a jornada até aqui: uma despedida que, se não arrepia, ao menos emociona.

Edição anterior (4011):
sábado, 20 de setembro de 2025


Capa 4011

Veja também:




• Home
• Expediente
• Contato
 (24) 99993-1390
redacao@diariodepetropolis.com.br
Rua Joaquim Moreira, 106
Centro - Petrópolis
Cep: 25600-000

 Telefones:
(24) 98864-0574 - Administração
(24) 98865-1296 - Comercial
(24) 98864-0573 - Financeiro
(24) 99993-1390 - Redação
(24) 2235-7165 - Geral