COLUNISTA
Há quatro anos e dez meses recebemos, com profunda tristeza, a notícia do falecimento do Acadêmico Emérito, ex-titular da Cadeira nº 10 da Academia Petropolitana de Letras, Desembargador e Professor Antônio Izaias da Costa Abreu, ocorrido em 18 de janeiro de 2021, no Rio de Janeiro.
Amigo, mestre e confrade querido, Izaias permanece como uma sarça ardente em nossas memórias e afetos.
Seu retorno ao regaço do Pai é para nós a certeza da vida eterna.
Agora, junto à querida Senhora Maria da Penha, desfruta da paz celestial e dos braços de Maria Santíssima.
Honrou-me criar a capa de seu primeiro livro, “O Linguajar do Marginalizado”, lançado com grande prestígio no Tribunal do Júri.
Desde então, sua produção literária só fez confirmar o brilho de seu espírito e a emotividade de sua pena.
Neste diapasão, ao ler Ternas Recordações, obra que revela seu coração e sua alma, compreende-se por que certos homens não se furtam a falar do afeto em sua plenitude.
Como os grandes clássicos Anacreonte, Safo, Shakespeare, Camões ou Cervantes , Izaias soube transformar a experiência humana em poesia, extraindo das lágrimas e dos sorrisos da infância a lição da fé, da justiça e da paz.
Na tessitura de seus versos, a palavra se torna luz e consolo.
Seu poema, impregnado de amor, é grito de concórdia e fraternidade, recordando que o verdadeiro humanismo nasce do espírito poético.
Num mundo dominado pela técnica e pelo consumo, ele acreditou no valor do ser sobre o ter.
Versos como o do poema Eu Tenho “Tenho tudo. Mas tudo isso nada representaria, se me faltasse o amor” bastariam para resumir sua obra.
Assim como o apóstolo Paulo ensinou aos Coríntios, Izaias compreendia que sem caridade nada teria valor.
De alma dócil e espírito firme, soube equilibrar a autoridade do magistrado à sensibilidade do poeta.
Em Saudade, revelava o filho terno; em outros poemas, o esposo dedicado à doce Maria da Penha, o pai amoroso de Beatriz e Elizabeth e o avô zeloso de Felipe, Pedro Henrique e Eduardo.
Seu estro poético flui em aliterações suaves e sonoridades puras, como o “dançar com a rosa formosa”, bailado digno de Terpsícore.
Em Súplica, revela-se a comunhão entre Criador e criatura, o despojamento franciscano de quem reconhece Deus como Supremo Juiz.
Antes mesmo de se dedicar à literatura, encantava seus jurisdicionados com sentenças de rara beleza e seus alunos com aulas que uniam rigor e estesia.
Antônio Izaias, cultura polimorfa, clareza e estilo revelavam desde cedo o poeta que sempre existiu em seu íntimo.
Criador de neologismos, Izaias mostrou que o fascínio decantado há milênios ainda pode ser visto sob a ótica do bem e do belo.
Sua obra é ritmo e coesão, marcada pela musicalidade da língua portuguesa e por um lirismo que lembra os melhores clássicos.
Mesmo num mundo globalizado e massificado, Izaias manteve acesa a chama da cultura e do humanismo.
Foi membro de diversas Arcádias Culturais no Brasil e no exterior.
Além de professor universitário, exerceu o cargo de Desembargador Presidente da Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, e, já aposentado, integrou o Museu da Justiça, coordenando o Grupo de Altos Estudos da Memória Judiciária.
Entre suas obras de destaque estão O Linguajar do Marginalizado, A Morte de Köeler, Quilombos em Petrópolis, Municípios e Topônimos Fluminenses e Júlio Frederico Köeler O Arquiteto.
Poeta, cronista e historiador, Izaias foi, como disse Proust, “um menestrel dos deuses”.
E, conforme Drummond, “vão-se os poderosos e fica a fragilidade da poesia”.
Aristóteles via na inspiração a catarse e o prazer elevado; Izaias a praticou como missão de vida.
Hoje, ao recordar sua trajetória, lembramo-nos de Alphonsus de Guimarães, que via no poeta um anjo; e de Oscar Wilde, para quem o artista tem algo de divino.
Assim era Izaias: magistrado e poeta, razão e ternura em perfeita harmonia.
Ternas Recordações aureolou sua fronte de escritor e imortalizou sua contribuição à língua portuguesa.
Que sua musa continue iluminando o caminho dos que buscam o arrebatamento, a equidade e a formosura porque, no plenilúnio da arte, o Olimpo se abre para receber os poetas verdadeiros.
Izaias, certamente, é um deles.
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