Edição: domingo, 24 de agosto de 2025

Frederico Amaro Haack

COLUNISTA

Frederico Amaro Haack

A RUA DO IMPERADOR EM MEADOS DO SÉCULO XX


Os tempos são quentes em 1935. Agora são Socialistas e Fascistas que se digladiavam, desde discursos às vias de fato: 9 de junho de 1935, comício socialista na Praça D. Pedro II termina em passeata pela avenida, indo em direção à Rua Cruzeiro (Dr. Nélson de Sá Earp), onde localiza-se a sede da “Ação Integralista Brasileira”, fascistas. Boa coisa não poderia acontecer, além de feridos, um operário é morto a tiros. No dia seguinte, o enterro do operário da Têxtil Santa Helena, acontece greve geral dos têxteis apoiados por outros sindicatos, inclusive pelo poderoso Sindicato dos Ferroviários, que conduzem por trem os trabalhadores da Cia.

Petropolitana de Cascatinha, “u treim dus italianu”. Era comum na época, o comércio da avenida cerrar suas portas em sinal de respeito e luto, quando algum político ou cidadão de destaque na sociedade falecia na cidade. Os operários revoltados os intimidaram a também fechar as portas, pelo companheiro morto; há confusão, alguns comerciantes reagem, se negam a fechar seus estabelecimentos, lojas são apedrejadas e saqueadas, a polícia se intimida, aguarda reforços vindos de Niterói. Por fim, todo o comércio fecha, inclusive bares, restaurantes e cafés, tais fatos se sucedem pela manhã.

À tarde, no Valparaíso, o clássico da cidade, grande público, o Serrano vence o Petropolitano por 5x3. Nos cinemas da Avenida XV de Novembro, em cartaz: No Petrópolis “Duque de Ferro”, com Georg Arlysse e no Capitólio “Acima das Nuvens”, com Robert Armstrong e Dorothy Wilson. Ao cair da tarde a cidade é tomado por forças militares, um piquete de cavalaria vindo de Niterói desfila pela Avenida XV de Novembro ao som de clarins intimida os grevistas. Há seções nos cinemas à noite, soirées.

Pela década de 1930 a Avenida viu, além das lides políticas, surgir no alvorecer 1929/1930 o primeiro “arranha-céu”, o prédio do Grande Hotel, seis andares em dois blocos no nº 547. Os bondes, que haviam começado a circular em 1910, param em dezembro de 1939, encerrando um ciclo do transporte coletivo de Petrópolis; inicia-se o império do transporte rodoviário. Tempos difíceis se aproximam, o mundo em guerra, e a Avenida XV de Novembro não
poderia passar incólume. Paixões políticas desfilam pelas calçadas, bares e cafés, a tensão política vai em um crescendo desenfreado, até que a 18 de agosto de 1942, a notícia do torpedeamento de mercantes brasileiros por submarinos alemães explode a indignação patriótica popular. Insuflados por oradores, responsáveis e irresponsáveis, que se sucedem desde o coreto da Praça Dom Pedro II. A massa, indignada, agitadores mal-intencionados e desocupados em geral, saem pela avenida, destruindo, saqueando e agredindo proprietários de casas comerciais que pertencem ou têm nomes que lembrem os países do eixo, Alemanha e Itália: Padaria Alemã, Joalheria Rittimayer, A Óptica, de Rodpolh Haack, Restaurante Falconi, Sapataria Schittini, Magazines De Carolis e Gelli, entre outros pela cidade. Alguns trocaram suas denominações comerciais, como a Padaria Alemã, que se tornou Padaria Petrópolis.

Os acontecimentos levam à decretação de “toque de recolher” pelas autoridades policiais, a 19 de agosto e por mais quinze dias, bares, restaurantes, bilhares etc. são obrigados a fechar às 22h e foi proibido o trânsito de pessoas e veículos após este horário. Também são proibidos novos comícios pelo delegado, Dr. José de Moraes Rattes, um descendente de colonos alemães. O tempo passa e a avenida viu o sofrimento de mães, que viram seus filhos chamados a lutar na guerra, marcharam sobre seus paralelos os soldados petropolitanos, muitos, descendentes de alemães e italianos, convocados para a FEB. Sentiu o cheiro e o barulho dos automóveis movidos a gasogênio, as filas nas padarias com a falta de pão, do trigo, todo importado. O ano de 1945 chegou com exaustão e promessa de paz, o verão chegava ao final e, as águas de março aprontavam.

Em 26 de março de 1945, segunda-feira, o comércio abriu o às 14 horas, tarde ensolarada e quente, abafada. Ao cair da tarde começa a chover, após as 21horas, aumenta de intensidade e por mais de duas horas chove  copiosamente. A Avenida XV de Novembro fica alagada como nunca; transbordam os rios Quitandinha e Palatinato, na “Bacia” o nível das águas atinge o alto das escadarias do Theatro D. Pedro (Teatro Municipal), a ponte em frente à Rua Barão de Teffé, de madeira, é completamente destruída, desaba e seus pedaços são levados pela correnteza.

Rapazes são vistos por jornalistas da “Tribuna de Petrópolis” nadando divertidamente, à altura da Rua Mal. Deodoro, desafiando à natureza. Após as águas voltarem para os leitos dos rios, ficou a lama, muita lama e lixo. Na manhã seguinte, durante os trabalhos de limpeza e levantamento dos prejuízos do comércio, diversas serpentes são encontradas, duas na Casa Sloper, (hoje uma farmácia, nº 60, da Rua do Imperador) os gritos histéricos e desesperados das moças balconistas do estabelecimento são ouvidos a distância, só com a chegada de soldados voltam ao interior da loja. Na agência do Banco do Brasil, na esquina da Rua Alencar Lima, no prédio construído para sede do falido Banco de Petrópolis, cédulas novas, ainda não postas em circulação, boiam dentro da agência.

Nos dias seguintes são colocadas a secar, em aquecedores elétricos e ao Sol, o que provoca grande curiosidade popular. Meses depois ainda há vestígios da inundação, a maior de todos os tempos na Rua do Imperador e, a 6 de maio de 1945 a população invade a Avenida XV de Novembro, na comemoração da paz e da vitória aliada na 2ª Guerra Mundial.

A década de 1940 viu a construção do Edifício Gelli, o maior de então, a fábrica de móveis fora transferida para a Avenida Barão do Rio Branco e a loja transforma-se em Magazine, o que mais tarde será conhecido como loja de departamentos. A construção de outros edifícios vai se dar na década de 1950, a começar pelo edifício “Minas Gerais”, na esquina com Rua Barão de Teffé e o “Imperador”, na esquina da Rua Paulo Barbosa, no local do demolido
prédio do Colégio Pinto Ferreira, ambos nos primeiros anos da década. A tendência à verticalização da Rua do Imperador se intensifica a partir da década de 1960 e atinge seu ápice na de 1970. São demolidos, progressivamente, prédios do final do século XIX e início do século XX.

O ano de1956 vê, em nome do progresso, a definitiva descaracterização da Avenida XV de Novembro/Rua do Imperador. As árvores centenárias, são derrubadas. As pontes vermelhas de madeira, há décadas vinham sendo trocados por concreto armado, já não existem. Agora são as margens dos rios, uma obra que promete, enganosamente, o fim das “enchentes”. Emparedados os córregos correm por entre muros de concreto, onde as bocas negras dos esgotos neles projetam as mesmas “imundícies” de 1878. Em um arremedo de “Bèlle Époque” são colocados balaústres de concreto em corrimões de concreto.

Isto tudo tem autores e nomes: o prefeito Flávio Castrioto de Figueiredo e Mello e o chefe da Engenharia da PMP, engenheiro Elyr Allah Rodrigues. O prefeito convoca uma comissão de cidadãos ilustres, para corroborar com seu plano de obras para a principal via pública da cidade, foram eles: engenheiros Alfredo Baeta Neves, Sady Mello e Silva, Elyr Allah Rodrigues, Sérgio Júdice e Affonso Monteiro da Silva; médicos sanitaristas, Mário Pinheiro, Germano Bretz e Domingos Padula e o industrial José Soares de Sá.

No jornal “Diário de Petrópolis”, em agosto de 1956, na coluna “A Engenharia do Município”, assinada pelo engenheiro Elyr A. Rodrigues, esse dizia: 1 Urbanização da Av. XV de Novembro com a quase conclusão do trecho entre as ruas João Pessoa e General Osório, já se pode ter uma idéia do novo aspecto urbanístico da nossa principal artéria. O alargamento da Rua Marechal Deodoro e das pontes fronteiras a essa rua e a Rua General Osório faz parte do plano geral e veio estender os limites para a solução do problema do tráfego. As árvores e flores definitivas serão, dentro de poucos dias, plantadas nos canteiros especiais. As pistas de tráfego estão ganhando um metro em toda a sua extensão e um passeio de 1,30m de largura foi criado, não só para compor o conjunto, como também para proteção do pedestre. O revestimento das paredes laterais do canal em lajotas, veio dar o acabamento condizente com o local e facilitar o escoamento das águas nos períodos de enchentes. A balaustrada, muito bonita, completa um todo realmente interessante. Se algumas condições essenciais e intrínsecas acompanharem o
expresso desejo do Sr. Prefeito, devemos atingir, até fins de dezembro, a parte fronteira ao restaurante Falconi. Estamos ultimando os cálculos, projetos e orçamentos para, independentemente do trecho citado, atacar o triângulo da Praça D. Pedro...” O mesmo “Diário de Petrópolis” estampa em 1ª página, a 3 de agosto de 1956, comentários elogiosos às obras: “... a ausência de árvores, por si só, veio estampar em nossa principal artéria um colorido diferente, rico e agradável, pois, em virtude dela, a Avenida recebe agora maior volume de luz natural. A esse tempo, 1956/57, são trocadas as lâmpadas incandescentes da iluminação pública, por lâmpadas fluorescentes. Uma chuva forte, a 8 de abril de 1957, faz com que os rios da Avenida XV transbordem, causando grande prejuízo aos comerciantes, fato agravado pelas obras que estavam em andamento. Em 13 de abril de 1957, o articulista Henrique Pongetti, através da “Tribuna de Petrópolis”, tece considerações acerca da “modernização” da cidade: “... os petropolitanos precisão defender Petrópolis dos atentados, injustificáveis, cometidos em nome do progresso. A mais bela cidade-jardim do mundo está perdendo seu jardim e virando uma cidade qualquer...”

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