COLUNISTA
Gastão Reis (*)
As pessoas respondem a incentivos tanto de curto quanto de longo prazo. Através da História, alguns povos foram capazes de perceber antes dos demais qual seria o caminho a seguir para se desenvolver no plano socioeconômico. É sempre citado o caso da Inglaterra com Adam Smith e seu livro, publicado em 1776, “A riqueza das Nações Uma investigação sobre a Natureza e as Causas da Riqueza das Nações”. O sugestivo subtítulo nos encaminha para algo maior. Buscava ir além no sentido de reduzir a grande quantidade de pessoas pobres que desde sempre acompanhava a humanidade. E a Inglaterra não era exceção na época dele.
Adam Smith nos revelou as leis de mercado que se impõem mesmo quando o arcabouço legal insiste em entrar em choque com elas. O exemplo clássico é o tabelamento de preços. Hamurabi, quase dois mil anos a.C., e o imperador romano Diocleciano, em 301 d.C., bem que tentaram, mas deram com os burros n’água a despeito de pena de morte para quem burlasse a lei. A América Latina, que incluiu o Brasil, cedeu à tentação, por diversas vezes, de instituir o controle de preços apesar das lições da História de milênios atrás.
Dois outros exemplos foram reveladores dos custos astronômicos de brigar com as leis de mercado: a ex-URSS e a China. Ambas acabaram adotando reformas profundas na economia para sair da estagnação e abrir espaço para permitir o crescimento econômico regido, na maior parte, pelas leis de mercado. Mao Tsé-Tung ficou famoso por suas políticas desastrosas na economia. Uma delas gerou fome generalizada que matou milhões de pessoas. A outra foi a Revolução Cultural, que paralisou o ensino superior chinês por uma década. Ele enviou os professores universitários ao campo para aprenderem com os camponeses a dureza da vida e seguir seu exemplo de rígida disciplina no trabalho. Pura perda de tempo.
As pessoas de mais idade se recordam bem dos fiscais do Sarney, então presidente, na luta, inglória e patética, de controlar preços. Na verdade, não percebiam que estavam dando corda ao mercado negro. Como sempre, os produtos somem das prateleiras e dão as caras no mercado negro, onde o consumidor tem que pagar bem mais para obtê-los. Antes que você pense que o problema é o malvado capitalista, é bom lembrar que ele também pagou mais ao fornecedor para dispor dos produtos.
Gustavo Corção (1896-1978) foi um famoso escritor, engenheiro, ensaista e jornalista brasileiro. Pertenceu à Ação Patrianovista, que combatia a carestia, palavra muito em moda nos tempos em que viveu. Ajudou a montar uma cooperativa para combater a cobiça dos comerciantes. Sua empolgação acabou no dia em que o quilo da batata na sua cara cooperativa estava acima do preço cobrado no armazém do Manoel ali na esquina. E foi assim que ele se deu conta das razões de mercado que regulam os preços.
Roberto Campos, nos tempos da Lei da Informática, que atrasou o Brasil em uma década ao fechar o mercado às importações no setor de informática, foi um combatente feroz da burrada que estava sendo feita. Ainda me lembro de um alto funcionário da IBM criticando o que chamava de tarifa infinita. Ou seja, a simples proibição de importar peças e produtos que ele precisava. Disse mesmo que era melhor uma tarifa elevada do que simplesmente impedir que o País pudesse ter acesso a produtos de ponta fabricados no exterior. Daí o atraso de dez anos que nos vitimou.
Mas não pense, caro(a) leitor(a), que são águas passadas. Tomemos o caso dos salários nos setores público e privado. No passado, em meados do século XX, trabalhar no setor público era a certeza de ganhar pouco. A dita Revolução de 1964 começou a mudar a situação oferecendo oportunidades bem remuneradas no setor público. Colegas meus fizerem concurso para o recém-criado Banco Central, e lá se aposentaram. Ou mesmo para outros empregos financeiramente atraentes criados em atividades de governo.
Essa elevação no padrão de remuneração do setor público fazia sentido na época para conseguir atrair mão de obra qualificada necessária à modernização do serviço público e em sua capacidade de dar bom atendimento ao público. Mas o processo foi longe demais, tornando o Brasil um dos raros países onde o salário médio do funcionário público é o dobro de quem faz a mesa coisa no setor privado. O absurdo, de fato, está alta burocracia. Nos outros países, os salários tendem a se equilibrar, evitando diferenças abissais como as nossas.
É claro que essa disparidade provocou mudanças no mercado de trabalho. Os melhores universitários passaram a se interessar em faz concursos públicos e trabalhar nos governos nas três esferas. Outras profissões de máxima importância para o desenvolvimento do país começaram a encolher. No ensino técnico, os jovens que optam em fazê-lo é de apenas 11% ao passo que na Europa atinge 44%. Na engenharia, o Brasil forma hoje menos engenheiros do que o México. Mais grave ainda: o número de brasileiros nos vestibulares engenharia vem caindo. Trata-se de uma profissão de importância vital para o futuro do País na era de TI Tecnologia de Informação.
Constatar o fato na base do lamento é muito pouco esclarecedor. Olhar para o tipo de incentivo que vem sendo dado é que nos leva ao âmago da questão. Os incentivos estão com sinal trocado. Eles direcionam as melhores mentes para o setor público. Logo, não há nada de surpreendente com o que vem acontecendo em detrimento do País como um todo. A má qualidade da instrução em matemática no ensino fundamental e médio explica a opção por outras profissões menos exigentes em termos de matemática.
É evidente a distorção brutal no mercado de trabalho contra os interesses do País. A baixa taxa de crescimento da renda real per capita nas últimas décadas é reveladora do nosso descaminho. A trajetória sociopoliticoeconômica do país precisa dar um cavalo de pau para voltar a caminhar na direção certa. Caso contrário, vamos marcar passo, crescendo pouco, e perdendo posição relativa face aos demais países.
Nota: Digite no Google minha palestra: “Desconhecer leis econômicas dá pre-juízo”. Ou pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=gV7NNj_uRkM
Autor: Gastão Reis
Economista e escritor . E-mails: gastaoreis@smart30.com.br // ou gastaoreis2@gmail.com
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