Edição: segunda-feira, 21 de abril de 2025

Gastão Reis

COLUNISTA

Gastão Reis

ONDE FICA A DEMOCRACIA ENTRE AS ELEIÇÕES?

O movimento pelas Diretas já! empolgou a população brasileira na época. A eleição indireta do presidente da república tinha, cada vez mais, o sabor de cartas marcadas. A exceção foi Tancredo Neves, mas morreu antes de tomar posse. O povo, legitimamente, queria se fazer ouvir na escolha da mais alta magistratura do País. Após alguns presidentes eleitos diretamente, chegou a hora de nos perguntarmos se a democracia presidencialista foi, de fato, a melhor opção em termos de resultados palpáveis, em especial na luta contra a desigualdade e desenvolvimento do País.

No período 1985/1988, após a promulgação da Carta de 1988, cuja intenção inicial era a de adoção do parlamentarismo, continuamos no presidencialismo, velho e cansado de guerra, gerador de crises e problemas decorrentes de sua própria natureza. Simplesmente não dispõe de um mecanismo de resolução rápida de crises político-institucionais em que o parlamentarismo sabe fazer, com desenvoltura, o dever de casa.

É preciso ir mais fundo para entender as graves falhas do regime presidencialista, em especial as do brasileiro. A constituição de 1891, elaborada por Ruy Barbosa, deixou de fora pontos contemplados pela carta americana. Lá, o presidencialismo foi abrandado pela forte presença do Parlamento na tomada de decisões do presidente. Como exemplos, dentre outros, cabe mencionar que a nomeação dos ministros de Estado tem que receber o aval do senado, coisa que, no caso brasileiro, é de livre arbítrio do presidente da república. E ainda o fato de o presidente americano não poder apresentar propostas de leis ao Congresso. Aqui, temos as medidas provisórias.

Mas as falhas, inexistentes na Constituição do Império, se manifestaram na primeira carta da república, desde 1891, quando foi promulgada. Vejamos  os entraves do  modelo presidencialista mal copiado da constituição americana: (i) perda dos instrumentos de controle e prestação de contas regulares (Chefias de governo e Estado na mesma pessoa); (ii) tendência a rupturas institucionais por falta de instrumentos ágeis de gerenciamento de crises (Gal. Deodoro fechando o congresso sem ter poder para tal); (iii) a confiança deixa de ser a pedra angular na manutenção de um governo  (sem o voto de desconfiança do parlamentarismo, um governo moralmente falido e corrupto pode continuar porque o mandato ainda não terminou); (iv) mistura entre funções executivas e legislativas (iniciativas de lei partindo do poder executivo no nosso caso); e (v) desrespeito ao orçamento que, na maior parte do tempo, não era impositivo.

A grande desilusão do povo brasileiro com os políticos e com os partidos tem a ver com nosso atual arcabouço político-institucional, motivo de desalento para o ex-presidente FHC em artigo publicado faz tempo. Na ausência de um conhecimento mais específico de nossa própria História, aquela com H maiúsculo, somos tentados a ir na direção do fatalismo: o Brasil foi sempre assim! Não tem mais jeito. Mas o curioso em nossa trajetória política é que passamos a ter problemas que não existiam na carta imperial de 1824.

Sem saudosismos, podemos citar duas ausências que passaram a acompanhar a vida republicana brasileira: o voto distrital puro, ou algo equivalente, e o chamado recall, que é a possibilidade de o eleitor destituir seu representante parlamentar, vereadores e deputados estaduais e federais, entre as eleições. Nos EUA, um deputado federal pode ser ou não reconfirmado no meio do mandato de quatro anos. Mas há píses em que a lei permite a substituição do representante, em pleno mandato, por voto de desconfiança no distrito eleitoral e sua substituição por outro indicado pelos representados.

Essas possibilidades são ignoradas por quase totalidade do eleitorado brasileiro. Está tão acostumado aos vícios do presidencialismo e suas regras tortas como se fossem as únicas de um bom sistema eleitoral. Até pessoas bem-informadas desconhecem tais alternativas que dão poder ao eleitor.

[C O N T I N U A]

Recentemente, conversando com um amigo, ele me disse que o Brasil era uma democracia. Ao dizer que discordava, ele se surpreendeu. Disse-lhe então que a ausência de controle efetivo dos representados sobre seus representantes faz com que o eleitor se sinta impotente diante de seus vereadores e deputados estaduais e federais. E estes vêm cometendo verdadeiros absurdos. O caso recente do orçamento secreto, em que os deputados podiam lançar mão de dinheiro público sem prestar contas do destino que lhe era dado, é algo inimaginável em democracias em que o eleitor está no comando. É preciso muita ingenuidade para não enxergar a porta aberta para a corrupção.

Igualmente grave é uma herança maldita não aquela do Lula em relação a FHC, que era bendita , que nos foi deixada pelos militares. E está de pé até hoje, embora já exista dispositivo legal para a devida correção. Eu me refiro a representação desproporcional entre o Nordeste e Norte e os estados do Sul e Sudeste. Nestes, para eleger um deputado feral é preciso cerca de cem mil votos ao passo que naqueles, entre 15 e 20 mil votos são suficientes. São Paulo tem que se contentar com apenas 70 federais quando deveria ter bem mais. Em suma, os votos de certas regiões valem bem menos do que as de outras. O critério de um homem um voto não é seguido pela “democracia” brasileira.

Manifestações de peso de juristas de renome nacional deixam claro que a Carta de 1988 teve um efeito paralisante sobre o desenvolvimento do País. Pior ainda é a distribuição dos impostos em que o governo federal abocanha 50 de cada 100 reais arrecadados, os estados, 30 e os municípios, cerca de 20 reais cada um. Nos EUA, esta distribuição é o oposto. O município é que fica com 50 de cada 100 dólares arrecadados em seu território, os estados, 30 e o governo federal, apenas 20. E, no Brasil, para receber metade desses 20, depende de tratativas em Brasília. Outra porta aberta para a corrupção.

Onde fica a democracia entre as eleições? Não fica!

Nota: Digite no Google: “Dois Minutos com Gastão Reis Futebol e política”.  Ou pelo link: https://www.youtube.com/watch?v=Pb86v1krHfE

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