COLUNISTA
Este é um texto que trata de lembranças. Lembranças que, em seu devido tempo, provocaram sensações marcantes e indeléveis. Uma marcante sensação de perigo em minha infância originou-se de uma brincadeira comum entre os alunos de natação da professora Maria Lenk, na piscina do Hotel Copacabana Palace. Maria Lenk foi uma grande atleta olímpica brasileira. Era referência na natação e cujo nome é, ainda hoje, lembrado em diversos parques olímpicos. Eu tinha uns 4 ou 5 anos na ocasião e uma vez sofri um “caldo” de um menino mais velho. Aquela sensação de afogamento, beber água e não conseguir respirar ficou para sempre presente
em minha mente, embora depois eu tenha até sido um razoável nadador.
Sensação de morte.
Outra sensação dos tempos antigos era passar sob a marquise do Cinema Metro Copacabana em dias de calor. Por algum artifício de marketing, o Cinema resolveu, além de refrescar seus salões, fazer o mesmo com a calçada em frente à porta principal e era um bálsamo nos dias de verão passar por ali. Não há pessoa de minha geração que não se lembre disso. Sensação de alívio.
A campainha que tocava às 16:50 marcando o fim da quinta aula do período da tarde do Colégio Santo Inácio era um enorme sinal de alegria em uma rotina que havia começado bem cedo pela manhã. Rotina pesada na qual se sucediam inúmeras atividades, sempre corridas, e algumas até muito tensas em dias de prova ou outros eventos especiais. A partir da campainha, a expectativa de retorno para casa e de descanso ou distrações aleatórias representavam uma verdadeira sensação de reconquista de liberdade.
Anos depois, fui viajante frequente na velha ponte-aérea Rio São Paulo, com seus aviões Viscount ou Electra. Desembarcar no Santos Dumont e entrar naquele impressionante salão, onde um enorme painel retratava a história da aviação, tinha também este duplo efeito calmante: o de estar em terra firme e, ao mesmo tempo, reencontrar aquela destacada obra de arte popular, educativa e marcante da conquista científica e tecnológica do homem.
Sensação de segurança.
A primeira vez que viajei ao exterior foi quando ganhei uma bolsa de estudos para um estágio de 3 meses nos Estados Unidos. Pousei em Nova Iorque e fui direto para um hotel Sheraton, na sexta ou sétima avenida. Depois de tomar um banho, desci para a cafeteria. Isso foi em 1967. A atendente me passou um daqueles menus plastificados com imagens de monumentais ícones de junk foods americanos: sundaes, pilhas de panquecas, mega sanduíches, ice cream sodas, travessas de danish pastries e de french toasts. Olhei para aquilo maravilhado e senti-me intimidado. Só consegui pedir um “coffee and milk”. A atendente me olhou com cara inquisidora e retrucou: “coffee and cream”? Eu, ignorante, respondi: “No, coffee and milk, please”. Naturalmente, ela me trouxe uma xícara daquele café americano e meio litro de leite gelado. Sorri amarelo e
agradeci “Thank you!”. Ao que ela respondeu “You´re welcome”. Fiquei desvanecido por ser considerado bem-vindo. E assim repetimos o “Thank you” e o “You´re welcome” umas 3 vezes. Até que um amigo me cutucou e falou que ela estava apenas respondendo o meu agradecimento e não me dando boas vindas. Sensação da dificuldade de dificuldade de ser compreendido no estrangeiro. Devo ter voltado aos EUA umas 40 vezes em minha vida e nunca deixei de me lembrar como aprendi a responder a um “Thank you”, coisa que nenhum cursinho ou aula haviam me ensinado.
As mais importantes sensações da vida, porém, são aquelas ligadas às relações humanas: encontro com o amor, a paternidade ou a maternidade, aquele abraço apertado em um bom amigo ou amiga, a perda de pessoas
queridas, ou a enorme satisfação de um dever cumprido. Uma ação caritativa bem sucedida ou a possibilidade de expressar um fervoroso agradecimento a quem tenha merecido.
Veja também: