COLUNISTA
Os primeiros sinais de vida civilizada, como entendemos hoje em dia, ocorreram quando homens que até então levavam uma vida nômade passaram a se fixar em aldeamentos nas margens dos grandes rios, como o Nilo, o Yangtzé e Tigre e Eufrates na Mesopotâmia. Isto se deu há cerca de dez mil anos e, concomitantemente, à domesticação dos animais e o cultivo agrícola.
O primeiro animal a ser domesticado foi o cachorro, que desde então constituiu um companheiro fiel do homem, um parceiro em suas noites de vigília e ajudante no manejo do gado. A parceria homens animais e plantas, portanto, tem uma dimensão histórica além de justificar um motivo a mais para respeitarmos a natureza em sua plenitude. Todas as formas de vida tiveram a mesma origem. Elas devem ser encaradas com a mesma dignidade e desta coexistência e serviço que umas prestam às outras, inclusive às custas da própria vida, emergiu o nosso modo de vida atual.
A tragédia do Rio Grande do Sul mostrou a fragilidade que os animais encontram quando este tipo de evento extremo ocorre. Estima-se que cerca de vinte e cinco mil animais domésticos foram separados de seus ambientes e tutores e, ainda hoje, um mês após as primeiras enchentes, se encontram em condições super precárias de vida.
É importante destacar, no Brasil, o trabalho de uma entidade, o GRAD, Grupo de Resposta aos Animas em Desastres, atuante desde a tragédia de 2011 em Petrópolis e constituído formalmente há seis anos. O GRAD congrega o trabalho voluntário de pessoas dedicadas a causa animal de diversas áreas, muitos dos quais veterinários e resgatistas. Ao longo deste período o trabalho do GRAD ganhou reconhecimento privado e público, abriu-se para o recebimento de doações em dinheiro e multiplicou o seu corpo de voluntários que tem estado presente em todas as tragédias que envolvem animais no território nacional.
Na semana passada um grande marco na vida da sociedade civil ocorreu quando o GRAD assinou um termo de cooperação técnica com o governo do Rio Grande do Sul, onde foi instituído um Gabinete de Crise para a Fauna. O objetivo é que todas as ações sigam um protocolo que compreenda etapas como identificação de animais em risco, seu resgate, acolhimento, tratamento, busca por tutores antigos ou novos de forma a reintegrá-los a uma vida digna. O GRAD não apenas aportou uma significativa contribuição financeira aos esforços do Estado como atuará na coordenação de inúmeras ações de outras entidades e indivíduos que nesta hora procuram ajudar, mas que sem uma atuação disciplinada não conseguem o melhor resultado.
Tal cooperação entre uma entidade privada e o governo se dá no clima de conscientização generalizada da dignidade dos animais, como se viu no destaque dado pela mídia ao resgate do cavalo Caramelo e de inúmeras imagens de animais em sofrimento. Manifesta-se também dessa forma aquela parceria histórica dos primórdios da civilização e mesmo aquela imagem mítica dos tempos em que os bichos falavam e se comunicavam com os homens como nas velhas fábulas.
Longe está a preocupação de substituirmos os sentimentos de ajuda que nesta hora todos devem se dedicar, na medida das suas possibilidades, às vítimas, sejam elas humanas, animais ou mesmo dos ambientes naturais devastados. É importante ressaltar o olhar holístico, com respeito a todas as manifestações de vida em nosso planeta em que os humanos, nesta era do antropoceno, são os maiores responsáveis em cuidar.
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