COLUNISTA
José Luiz Alquéres, conselheiro do Clube de Engenharia
Estudos recentes de sociologia e política apontam que a decadência da democracia se dá com o enfraquecimento das instituições. Instituições são, em geral, aquelas entidades governamentais, em especial, as que tratam do sistema judiciário, da ordem pública, da economia, e da defesa nacional. Não há duvida que a decadência da democracia é simultânea ao eventual enfraquecimento de todas estas instituições, mas isto não é uma condição suficiente.
A democracia entra em decadência quando não consegue dar resposta aos problemas do dia a dia da habitação, da alimentação e da segurança. Quando tais necessidades básicas não são atendidas, não há desenho institucional que sustente um regime político, como se viu na emergência do fascismo na Europa. Além disso, a democracia requer um extremo cuidado no tocante à sensação de seguridade das populações, hoje
preocupadas com a enorme incerteza a respeito do futuro.Não existe solução simples para produzir confiança na democracia, mas um dos vetores principais é a existência de um projeto nacional de desenvolvimento realista e inclusivo, ou seja, que não deixe marginalizados enormes segmentos da população, como o foram projetos autoritários realizados em muitos países no século passado. Este fato realça a importância de se associar a democracia à engenharia.
Engenharia para os efeitos deste artigo compreende todas as atividades ligadas ao desenvolvimento de infraestruturas habitacionais, de saneamento, de logística e de mobilidade, de provisão de serviços públicos de eletricidade e de comunicações, bem como tudo que se refira à implantação de indústrias, estaleiros, parques industriais e outras obras que assegurem qualidade de vida e emprego às populações de um país. Enchentes e inundações não são compatíveis com a democracia. Racionamentos de água ou de energia não são compatíveis com a democracia. Habitações sub-humanas não são compatíveis com a democracia. Quando estes fenômenos ocorrem, eles apontam que o regime de governo já deixou de ser uma verdadeira democracia, pois não está proporcionando aos cidadãos condições mínimas niveladas às suas necessidades.
No Brasil, impõe-se a criação de um projeto nacional que volte a integrar todos esses aspectos essenciais à provisão de uma vida digna para sua população. Já possuímos projetos razoáveis no passado, mas perdemos completamente a capacidade de oferecer um plano que dê esperanças gerais de melhoria de vida. Para isso, não é suficiente se falar apenas em equilíbrio das contas, instituições sólidas, STF prestigiado e coisas deste jaez. É essencial um projeto nacional que explicite os avanços nos setores produtivos, quantificando metas pelas quais os governantes sejam responsabilizados em viabilizar. A boa engenharia precisa estar de volta. Um esforço que deve nascer na busca da excelência das universidades, na pesquisa, na preocupação com a sustentabilidade, nas políticas de desenvolvimento de pessoal e na atração de investimentos.
Existe uma enorme impaciência na sociedade que se depara diariamente com o deletério espetáculo de discussões, barganhas, prisões, relaxamento de prisões, envolvendo sempre os mais altos escalões dos poderes executivo, legislativo e judiciário do país. Os ministérios afetos às políticas de desenvolvimento têm demonstrado sua total incapacidade de trabalhar em conjunto e formular planos viáveis que conversem com as
metas financeiras estabelecidas pelo ministério da economia. O descontrole inibe, além do próprio governo, todo o setor produtivo nacional e a proximidade de eleições municipais irá transferir a pauta das preocupações nacionais para uma miríade de questões paroquiais dos nossos 5.571 municípios. É, pois, uma situação preocupante em que, mais do que nunca, o tradicional cartesianismo dos engenheiros está fazendo muita falta no estabelecimento da abordagem para superação dos problemas nacionais.
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