COLUNISTA
As recentes comemorações dos 30 anos do Plano Real têm merecido uma série de seminários técnicos, entrevistas com os principais economistas da época e outras justas celebrações.
Sem desmerecer as homenagens atuais, ressalto que o sucesso do plano veio do amadurecimento de um processo cuja origem deve ser buscada alguns anos antes, quando a preocupação com a inflação já havia se tornado o maior problema nacional, atingindo seu ápice em janeiro de 1990, quase ao final do governo Sarney, com incríveis 89% ao mês.
Naquela ocasião, eu era Diretor de Planejamento e Engenharia, mas estava respondendo interinamente pela presidência da Eletrobras, o que me obrigava a frequentes contatos com o alto escalão ministerial em Brasília. Lá, os órgãos institucionais funcionavam de forma muito precária e, na contingência de reajustar as tarifas de energia elétrica quatro vezes por mês, meu único interlocutor confiável era o Ministro General Ivan de Souza Mendes, que se articulava com o Ministro Maílson da Nóbrega. Havia uma pressão para que Sarney, seguindo o exemplo de Raúl Alfonsín, na Argentina, entregasse o governo ao seu sucessor antes do fim do seu mandato.
Quando o Presidente Collor tomou posse e anunciou o Plano Cruzado, divulgou o conceito da bala de prata, a tacada com a qual esperava matar o dragão de uma só vez, menosprezando o caráter que a inflação já havia adquirido de doença crônica a ser combatida ao longo do tempo até ser extirpada do organismo econômico e social. Com o radical confisco das poupanças dos brasileiros, o que não começou bem, acabou pior ainda.
Com Marcílio Marques Moreira e sua equipe, em grande parte participante da implantação do Plano Real, a abordagem correta veio, então, a ser empregada, conforme se viu na redução dos índices inflacionários do período.
O Presidente Itamar Franco, engenheiro de formação, ao designar Elizeu Rezende, comprou a tese de ajustes nos preços relativos dos bens e serviços, altamente distorcidos face os diferentes calendários dos respectivos reajustes. Este ajuste teve início pelos preços de derivados do petróleo e da energia elétrica.
preocupação em reestabelecer o equilíbrio entre os preços relativos dos produtos essenciais, inclusive petróleo e energia elétrica, foi conseguida, e Fernando Henrique Cardoso, com a brilhante equipe que reuniu, deu continuidade ao processo de equilíbrio orçamentário, reformas econômicas e instalação de agências regulatórias para controle técnico dos preços públicos, basicamente estruturando o tríplice controle de metas de inflação, câmbio flutuante e equilíbrio fiscal, ao lado da redução de gastos públicos e impulso às privatizações. Cabe registrar, dentre os esquecidos nesta hora de comemorações, Rubens Ricúpero e Ciro Gomes, que deram continuidade às medidas preconizadas pelos seus antecessores.
Armínio, Malan e Gustavo Franco ressaltam em suas entrevistas publicadas em O Globo nesta semana que a importância do equilíbrio fiscal ainda não foi absorvida, seja pela sociedade, seja pelo governo, influenciado pela classe política inescrupulosa.
Esses fatos fazem com que a inflação, embora não mais o dragão do passado, tenha se transformado em uma repulsiva lagartixa que se recusa a morrer, pois o desequilíbrio fiscal que leva a juros elevadíssimos inibe os investidores, que preferem aguardar melhores momentos concentrando seus capitais em aplicações financeiras e em ambientes com menores riscos futuros.
O Presidente Itamar Franco, em um momento extremamente complexo, sem maioria no Congresso, deu o seu apoio a Fernando Henrique Cardoso como Ministro da Fazenda e este soube, magistralmente, conduzir, não sendo economista, o processo que levou o Brasil a se livrar de quase cinco décadas da doença crônica.
Há urgência para que o governo restaure a melhor ordem econômica sem a qual não conseguiremos a maior geração de bons empregos, correção de desigualdades sociais e o progresso econômico do Brasil.
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