COLUNISTA
Podemos associar o termo Natureza à vida na Terra, algo que remonta a cerca de 4 bilhões de anos. Nessa mesma Terra, após várias eras geológicas, surgem, há 4 milhões de anos, aqueles mamíferos de cuja linhagem vai originar o Homo Sapiens cerca de 400 mil anos atrás. Dele descende o nosso antepassado Homo Sapiens Sapiens que, há 40 mil anos, passa a predominar sobre outras espécies humanas e que há 10 mil anos começa a se sedentarizar em vilas situadas nos vales dos grandes rios do Egito, da Mesopotâmia e da China.
Podemos afirmar que a Ciência como a entendemos hoje em dia nasce nesta fixação do homem à terra, o que lhe possibilita viver em comunidade e ter mais tempo para pensar além da sobrevivência diária. Em tal momento 2 tipos de preocupação estavam presentes na vida do homem: sobreviver às condições mutáveis dos fenômenos da Natureza e sobreviver aos ataques de outros membros de sua espécie. Estou incluindo em fenômenos da Natureza enchentes, deslizamentos de terra, secas, pragas, pandemias e outras tragédias semelhantes que aqueles homens primitivos consideravam obras de espíritos cuja complacência procuravam obter através dos mais variados sacrifícios. A Natureza era algo vivo e que intencionalmente atacava os homens.
Abstraindo-nos de tratar das relações ora belicosas, ora amigáveis dos homens com outros homens, podemos dizer que este alvorecer da vida urbana até o final do século XVII, quando se inicia o Iluminismo e a Revolução Industrial, a percepção do homem era que vivia em guerra com a natureza e esta estava ganhando. Em outras palavras, as pestes, pandemias, terremotos, fenômenos naturais, a maioria oriundos de causas para o homem inexplicáveis, ganhavam sempre nos confrontos que iam surgindo. É sintomático que o grande terremoto que destruiu Lisboa em 1750 foi considerado pela Igreja local uma reação de Deus a uma cidade pecaminosa, a exemplo do episódio bíblico da destruição de Sodoma e Gomorra.
A partir do Iluminismo, a Ciência e a Razão passam a explicar os fenômenos naturais e, com isso, criam a possibilidade do homem deles se defender. A guerra se inverte. O homem passa a atacar a Natureza. Drena pântanos, desenvolve remédios, extermina pragas, estrai energia do subsolo, devasta e conquista florestas e pântanos e vai assim alterando a Natureza de forma a adquirir maior conforto, bem-estar e vida mais longa. Este processo de condicionar a Natureza às conveniências das gerações presentes, todavia, levou a profundas modificações nos sistemas naturais que saíram do controle dos agentes que as provocam. Existe um aquecimento da temperatura da Terra que já ameaça homens em várias regiões do planeta. Regiões estas que não são aquelas que provocaram as ditas alterações. Da mesma forma, há uma contaminação da atmosfera, uma acidificação dos oceanos, um enorme prejuízo para várias espécies marinhas e para o equilíbrio da captura de carbono pelas algas que se distribuem na superfície dos oceanos.
Exemplos como os acima mostram que, se na primeira etapa do confronto homem versus Natureza esta saiu ganhando, na segunda etapa a situação se inverteu e o homem destrói o funcionamento de vários sistemas naturais. O grande problema então que surge e que somente é enfrentado a partir da década de 80 do século XX é a necessidade dos homens e a Natureza se darem as mãos, pararem de mutuamente se destruírem e criarem, enquanto ainda é tempo, um modo harmonioso de vida em comum. Nesta terceira etapa a Ciência, que nas duas etapas anteriores teve seu desenvolvimento fortemente apoiado pelo seu uso para fins bélicos, dependerá do mecenato e compromisso com a sociedade civil para criar tecnologias e produtos sustentáveis.
Essa preocupação foi consensada no chamado Acordo de Paris em 2015, onde 195 países, reunidos pela ONU, admitiram com base nas melhores análises científicas que o mundo estava realmente em crise e que só a ação conjunta de todos os países e suas populações poderia restabelecer um modo sustentável de relações com a Natureza. A consciência que o homem é apenas uma das milhões de espécies que habitam o planeta e que sua ação está implicando na extinção de centenas de milhares de espécies por ano e que só uma guinada radical em nossos modos de produção e consumo vai permitir um mundo sustentável para nossos filhos e netos é, portanto, algo muito recente. Recente e urgente. Este tema deve estar na pauta de todas as pessoas e, muito especialmente, nas empresas e nas organizações públicas, a quem cabe um papel essencial na promoção da necessária transição para o novo mundo.
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