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Ronaldo Fiani

COLUNISTA

Ronaldo Fiani

As Novas Tecnologias Digitais e a Escala das Empresas


Ronaldo Fiani

No artigo do dia 2 de setembro no Diário de Petrópolis discuti o caso das fintechs como um exemplo dos efeitos das novas tecnologias digitais na competição (As Fintechs e a Nova Competição Digital, disponível em: https://diariodepetropolis.com.br/integra/colunista-ronaldo-fiani-9571 ). Naquele artigo, destacava como as novas tecnologias digitais reduziram a escala (isto é, o tamanho) com que as fintechs conseguiam operar com custos reduzidos e, desta forma, ofereciam preços competitivos pelos seus serviços, mesmo sendo pequenas. Antes destas novas tecnologias digitais, somente empresas financeiras que operavam em grande escala conseguiam operar com custos mais reduzidos, e assim eram mais competitivas.

As novas tecnologias digitais também permitem adequar melhor os serviços prestados ao perfil do cliente, o que propicia aquilo que os economistas chamam de diferenciação de produto. Há diferenciação de produto quando uma empresa consegue oferecer um bem ou serviço com características que seus competidores não conseguem imitar, e que os consumidores ou clientes valorizam mais.

Até aqui, as estratégias de competição se baseavam, essencialmente, em uma escolha entre economias de escala ou diferenciação de produto, em que uma delas predominava. Isto porque, para produzir um bem ou serviço em larga escala, o que reduz os custos por unidade de produto e permite que se cobre preços mais reduzidos, massificando-o, o produto tem de ser mais ou menos padronizado, o que reduz as possibilidades de diferenciação. Uma ênfase maior na diferenciação de produto significava menor escala e maior custo de produção, para poder adequar o bem ou serviço em questão ao perfil dos consumidores que se deseja atingir.

A perda de escala em razão da diferenciação de produto, e com isto a menor produção e o consequente custo mais elevado de produção obrigava as empresa que optavam por este tipo de estratégia a buscar satisfazer os consumidores de maior poder aquisitivo, de modo a poder cobrar preços mais elevados e obter margens de lucro mais expressivas, que compensassem o fato de produzirem em menor quantidade e com maior custo. Esta era a razão pela qual a diferenciação de produto era a estratégia preferida das empresas que não conseguiam entrar em um setor com larga escala, e tentavam se manter em seus mercados atendendo aos clientes de maior renda e riqueza.

Ocorre que a presença de economias de escala tem um efeito importante em termos de competição: o mercado acaba sendo dominado por um número pequeno de grandes empresas, com uma franja de pequenas e médias empresas que tentam sobreviver cobrando preços mais elevados de segmentos com preferências mais específicas do mercado.

Como foi visto no artigo sobre as fintechs, as novas tecnologias digitais permitiram às empresas do segmento financeiro investirem muito menos em escala do que os grandes bancos e seguradoras, alcançando mesmo assim grandes volumes de produção e, ao mesmo tempo, diferenciando seus produtos. Elas combinaram, portanto, produtos com perfis ajustados aos seus clientes (típicos de diferenciação) com preços mais baixos (típicos de economias de escala). Isto explica o crescimento acelerado deste tipo de empresa.

Isto significa que, daqui em diante investimentos em escala e, desta forma, grandes empresas não serão mais importantes? Esta tendência do segmento financeiro será uma tendência geral?

Embora seja sempre arriscado fazer previsões no início de revoluções tecnológicas, é possível identificar tendências que parecem descartar um futuro em que escala de produção não terá mais importância. Isto porque parece haver uma distinção nos efeitos das novas tecnologias sobre a competição, distinção entre quem é o usuário das novas tecnologias e quem produz as novas tecnologias.

Um exemplo típico é o caso dos chamados hyperscales, empregados pelas grandes empresas que oferecem serviços de dados na nuvem. Um hyperscale é um ambiente computacional com capacidade para acumular e processar volumes gigantescos de dados, muito utilizado para prestar serviços na nuvem. Por sua vez, os datacenters em grande escala que prestam este serviço que envolve volumes maciços de dados são chamados hyperscalers.
Assim, as fintechs viram sua necessidade de investir em escala para competir com as grandes empresas financeiras se reduzir, principalmente porque as novas tecnologias digitais permitem às fintechs utilizar a escala das empresas que atuam na nuvem. A necessidade de investir em agências bancárias, datacenters, computadores etc., que caracterizam o investimento em larga escala no setor foi substituída pelo recurso aos dados na nuvem.

Aqui vem o ponto central: a disponibilidade de recursos na nuvem reduziu a necessidade de ampliar a escala das fintechs, o que aumentou a competição no segmento financeiro, mas ajudou a concentrar a demanda nas grandes empresas que fornecem este tipo de serviço: Amazon, Microsoft, Google, Oracle e IBM. Enquanto o setor financeiro, que é usuário desta tecnologia viu a competição aumentar, as grandes empresas de dados na nuvem que são produtoras destas tecnologias estão vendo a competição diminuir e, assim, seu poder de dominar o mercado aumentar.

Esta parece ser a tendência geral: enquanto os setores usuários das novas tecnologias veem a competição aumentar (e seu poder de dominar o mercado diminuir), os setores produtores das novas tecnologias estão vendo a competição diminuir (e seu poder de dominar o mercado aumentar). Resumindo: os lucros vão se concentrar nos produtores das novas tecnologias, cujo poder de mercado vai aumentar.

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