COLUNISTA
Ronaldo Fiani
Posições radicais, que defendem uma espécie de “tudo ou nada” na abordagem de problemas econômicos que, por sua própria natureza, são complexos, inevitavelmente são equivocadas, ainda que tenham uma parcela de verdade.
Um caso típico é o crescimento da popularidade da corrente de pensamento econômico conhecida como austríaca, assim denominada pela importância dos economistas daquele país na formulação de suas ideias. Nomes como Carl Menger (1840-1921), Eugen von Böhm-Bawerk (1851-1914) e Ludwig von Mises (1881-1973) se destacam na formulação das bases desta escola de pensamento.
Entre eles, o pensador que mais se destacou foi Friedrich von Hayek (1899-1992), vencedor do Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel do Banco Central da Suécia de 1974 (juntamente com Gunnar Myrdal (1898-1987), que discordava de suas ideias). A escola austríaca vem ganhando muita popularidade recentemente, principalmente entre não-economistas, que enxergam nas suas ideias uma justificativa econômica para seus princípios políticos de rejeição radical de qualquer papel do Estado em relação à economia.
Os austríacos têm uma parte de razão no seu argumento, no que diz respeito à capacidade das empresas para inovar. Quando se trata de inovação, não há dúvida de que uma intervenção centralizadora promovida pelo Estado é nociva para a capacidade de inovar. Uma evidência histórica disso é o caso da extinta União Soviética onde, exceto em relação à tecnologia militar, a capacidade de inovação era muito reduzida. A causa disso era o planejamento central do Estado, que limitava a liberdade de iniciativa individual, concentrando as decisões em níveis muito elevados da burocracia estatal, que simplesmente não podiam conhecer as possibilidades de inovação que naturalmente se encontram disseminadas pela economia.
Hayek ofereceu uma explicação simples dos problemas que resultam da excessiva concentração das decisões econômicas no Estado: a diferença entre conhecimento codificado e conhecimento tácito. Conhecimento codificado é aquele que pode ser transmitido por intermédio de relatórios, gráficos, tabelas etc., ou seja, aquele que é passível de algum tipo de codificação. Se este fosse o único tipo de conhecimento, seria possível centralizar todas as decisões na economia, utilizando este tipo de informação.
Contudo, Hayek explicou que este não é o único tipo de conhecimento. Existe também o conhecimento tácito, isto é, aquele conhecimento que deriva da prática e não está escrito (codificado) em lugar algum, portanto, não pode ser transmitido para quem não o conhece. Por exemplo, a capacidade de um engenheiro solucionar problemas em um protótipo, baseado na sua experiência prática, ou a capacidade de um gestor de coordenar um grupo de pesquisa para estimular soluções criativas. Este tipo de conhecimento é tão importante como o conhecimento codificado para gerar soluções inovadoras e, como o conhecimento tácito não pode ser transmitido, planejadores em níveis elevados de hierarquia não conseguem planejar adequadamente como deve acontecer a inovação.
Contudo, ao contrário do que usualmente se supõe, inovação não é algo que acontece de forma isolada. Para que uma inovação seja bem-sucedida, é necessário que uma série de colaboradores da empresa inovadora atuem de forma coordenada. Isto exige que não apenas haja frequentemente recursos para financiamento dos fornecedores (além da firma inovadora), mas que os investimentos sejam coordenados em uma rede de inovações.
Isto porque, como explicou Oliver Williamson, quando os investimentos entre agentes privados estão vinculados, faz-se necessária uma adaptação coordenada aos desafios que a relação entre eles for criando. No caso de uma inovação, em que as incertezas são muito fortes, pois se trata de um novo produto ou um novo processo produtivo, esta necessidade de adaptação coordenada é ainda mais urgente.
Frequentemente, o único agente que pode promover esta coordenação, por não ser uma das partes envolvidas na inovação (e na disputa dos lucros que ela pode gerar) é o Estado. Além disso, frequentemente é o Estado que pode incorrer nos riscos de financiar uma inovação, algo que, por definição, ainda não existe e, portanto, é difícil avaliar o potencial de sucesso e de lucratividade.
Mas como lidar com o problema do conhecimento tácito? O melhor exemplo vem dos Estados Unidos, que possui um sistema de agências de financiamento e estímulo à inovação descentralizado, isto é, que se encontra próximo das empresas inovadoras, ouvindo as suas necessidades, e com flexibilidade para decidir de acordo com os problemas que forem surgindo.
Quando se trata de inovação, soluções radicais não funcionam: Hayek precisa encontrar Williamson.
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