COLUNISTA
Ronaldo Fiani
Recentemente, antes dos ataques norte-americanos ao Irã, o Banco Mundial divulgou uma previsão do crescimento econômico mundial que já não era nada animadora. Segundo o Banco Mundial, está será a pior década para o crescimento econômico global desde os anos 1960, já por conta das tarifas adotadas pelo governo dos Estados Unidos. Estimativas de crescimento globais são sempre complicadas, pois envolvem invitáveis distorções: por exemplo, países com economias mais importantes usualmente tendem a ter um peso maior, o que distorce a noção de que a medida calculada seria realmente “global”, isto é, representaria na mesma proporção todos os países, entre outros problemas.
Uma estimativa razoável do crescimento global em termos reais (isto é, descontada a inflação), medida pelo crescimento do produto interno bruto (a soma de todos os bens e serviços produzidos em um ano em um país) seria de 4,2% ao ano em média nos anos 1950, 4,5% nos anos 1960, 3,2% nos anos 1970, 3,1% nos anos 1980, em torno de 3,2% nos anos 1990, 1,9% nos anos 2000 e 2,4% nos anos 2010 (ver: https://www.crestmontresearch.com/docs/Economy-GDP-R-By-Decade.pdf.) Obviamente, não se trata de números rigorosos, como quando medimos uma grandeza qualquer com um instrumento de precisão. Mas elas mostram dois fatos que são reconhecidos na literatura sobre história econômica. Em primeiro lugar, que os anos 1950-1960 foram os chamados anos dourados do crescimento econômico. Apesar da crescente integração econômica
global, das reformas econômicas nos anos 1980-1990, e das mudanças tecnológicas que se verificaram desde o final da guerra, o crescimento não vem demonstrando o mesmo desempenho das duas décadas do imediato pós-guerra.
Segundo, e muito importante para o que queremos destacar neste artigo, há uma clara tendência de desaceleração econômica desde os anos 1980, tendo alcançado, até o momento, o seu patamar mais baixo nos anos 2000. Contudo, mesmo a pequena expansão nos anos 2010 foi o resultado da injeção de dinheiro na economia global pelos bancos centrais dos países desenvolvidos, após a crise de 2008. O leitor talvez esteja estranhando este resultado ruim nos anos 2000, uma vez que este foi um dos momentos de crescimento acelerado da economia brasileira, motivado em grande parte pela demanda chinesa por commodities (matérias-primas, ou produtos primários), que se tornaram o item mais dinâmico das exportações brasileiros, com o encolhimento da indústria do país.
Mas o casamento do agronegócio brasileiro com a expansão chinesa durante os anos 2000, um dos principais motores do crescimento econômico naquele momento, não foi uma tendência geral. Também não devemos esperar que esta fase favorável para a economia brasileira volte a se repetir, de acordo com os prognósticos do próprio Banco Mundial. Com efeito, as previsões do Banco Mundial acerca do comportamento dos preços das
commodities não são nada favoráveis, e a economia brasileira depende cada vez mais das commodities para ter um bom desempenho, com o processo de desindustrialização que vem acontecendo há décadas.
Para entender a razão das previsões ruins com relação às commodities, é preciso considerar que os preços dos produtos primários são determinados pela demanda internacional por estes produtos que, por sua vez, depende do crescimento da economia global. A previsão do Banco Mundial é de uma queda de 15% no preço das commodities usadas como fonte de energia, com redução substantiva na demanda por petróleo e queda acentuada
nos preços de todas as demais commodities este ano, com declínio um pouco mais suave no ano que vem: veja https://thedocs.worldbank.org/en/doc/8bf0b62ec6bcb886d97295ad930059e9-0050012025/global-economic-prospects-june-2025 .
Estas previsões foram feitas antes do agravamento das tensões no Oriente Médio. Não devemos nos iludir: ainda que crises no Oriente Médio possam ter um impacto positivo no preço do petróleo, e até mesmo nos preços de algumas outras commodities por conta das incertezas do conflito, o impacto mais duradouro será no comércio e na atividade econômica. Em outras palavras, ainda que possa haver altas momentâneas de preço de algumas commodities, a tendência de desaceleração vai ser mais forte e vai prevalecer.
Mas os problemas não terminam aí. Esta desaceleração vai afetar não apenas a atividade produtiva, mas também as finanças internacionais. Isto porque as rentabilidades de empresas e de projetos de investimentos, assim como as receitas de exportação de vários países (notadamente os países exportadores de commodities) vão começar a enfrentar adversidades, em razão da desaceleração econômica global. O aumento das dificuldades de empresas e países vai afetar negativamente o valor de títulos privados e públicos, assim como os dividendos das ações das empresas. Isto vai levar o sistema financeiro internacional a reduzir a liquidez global (isto é, a quantidade de dinheiro disponível) para se proteger do aumento da inadimplência, o que vai reduzir a circulação financeira e afetar novamente de forma adversa empresas e países, em um círculo vicioso de dificuldades crescentes.
O cenário é muito, mas muito preocupante.
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