COLUNISTA
Ronaldo Fiani
O recentemente aprovado projeto de lei orçamentária apresentado pelo presidente dos Estados Unidos Donald Trump, batizado por ele de One Big Beautiful Bill (o que poderia ser traduzido como Um Grande e Belo Projeto de Lei), vem criando várias controvérsias. Resumidamente, as controvérsias envolvem o aumento do teto para o endividamento federal, o aumento dos gastos em defesa e com controle de imigração, cortes nos gastos sociais e nos
subsídios para o desenvolvimento de energias limpas. Vale a pena discutir um aspecto econômico deste projeto que não está sendo considerado, e que envolve o investimento no desenvolvimento de fontes alternativas de energia. O corte nos recursos aplicados neste tipo de investimento tem provocado críticas de ambientalistas, uma vez que estas tecnologias reduzem as emissões de carbono, um dos principais agentes do aquecimento global.
Todavia, não vou abordar aqui o aspecto ambiental da redução do investimento em tecnologias limpas, embora reconheça a sua importância. Vou tratar de um outro aspecto, também muito importante, mas que tem sido ignorado: o aspecto de natureza econômica das políticas de estímulo ao investimento nestas tecnologias alternativas. As oportunidades oferecidas por novas fronteiras de investimento (ou seja, por novos setores com fortes perspectivas de crescimento e rentabilidade) são fundamentais para o desenvolvimento do sistema econômico moderno. Isto porque este sistema econômico tem um funcionamento muito peculiar, que nem mesmo todos os economistas reconhecem, presos que estão a teorias convencionais, que são úteis como simplificação com fins didáticos, mas que desprezam aspectos fundamentais da economia moderna.
Com efeito, o sistema econômico funciona de uma forma diferente daquilo que os economistas de formação mais convencional acreditam. Para os economistas com este tipo de formação, os empresários agem como se fossem “autômatos”: se obtiverem lucros em suas atividades, eles imediatamente reinvestiriam estes lucros na ampliação dos seus negócios. Desta forma, para que a economia cresça, segundo estes economistas, basta apenas a lucratividade dos negócios que existem. Ou seja, se o governo não interfere nos negócios, os lucros e o crescimento econômico estariam garantidos. Basta deixar os mercados funcionarem livremente, e tudo irá bem.
O problema com esta teoria é a hipótese simplificadora de que, desde que tenham lucro, os empresários irão reinvestir. Na verdade, eles irão reinvestir se acreditarem que haverá demanda para a produção adicional que obterão do seu investimento. Ninguém investirá, e ampliará sua capacidade produtiva, se achar que a produção adicional vai encalhar em estoques não vendidos.
Isto é especialmente problemático para setores que estão em decadência, ou seja, setores em que a demanda vem crescendo muito pouco, ou vem diminuindo. Ocorre que periodicamente vários setores na economia perdem capacidade de crescimento, quer por mudanças tecnológicas que os tornam obsoletos, quer porque sua tecnologia de produção se difundiu e a concorrência aumentou, forçando reduções de preços e, desta forma, reduzindo os
lucros. Por isso, para manter o dinamismo da economia, ou seja, sua capacidade de crescimento é preciso que surjam novos setores em expansão, oferecendo oportunidades de investimento com lucratividade elevada, de forma a atrair investimentos e, assim, sustentar o crescimento da economia. Estes setores são chamados de novas fronteiras de investimento, pois eles estimulam o investimento na forma de novas fábricas, novas empresas fornecedoras de insumos, novas empresas para a comercialização dos seus produtos etc.
Algumas vezes estas novas fronteiras de investimento surgem espontaneamente, como foi o caso da indústria automobilística no final do século XIX. Outras vezes, estas novas fronteiras surgem com o apoio do Estado, como foi o caso da computação eletrônica no chamado Vale do Silício na Califórnia nos anos 1950, cuja implementação teve forte apoio do Departamento de Defesa dos Estados Unidos. O setor de energia limpa cumpria exatamente este papel, o de uma nova fronteira de investimento na economia norte-americana, o que será prejudicado com a nova lei orçamentária do país. Apesar dos efeitos mais diretos da nova lei orçamentária só se manifestarem com mais
força a partir de 2027, quando alguns dos subsídios aprovados pelo presidente anterior Joe Biden cessarão, a falta de perspectiva para os investimentos no setor muito provavelmente irá desestimular os investimentos em tecnologias limpas, o que deverá contribuir para reduzir o crescimento da economia dos Estados Unidos.
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