Edição: domingo, 24 de agosto de 2025

Ronaldo Fiani

COLUNISTA

Ronaldo Fiani

Também por Causa da Automação, IA e o Futuro do Emprego, o Desenvolvimento Econômico Tem de Voltar ao Debate


Ronaldo Fiani

No artigo da semana passada, mostrei que a crise da ordem mundial construída no pós- guerra tornava urgente o debate sobre desenvolvimento em países como o Brasil. No artigo desta semana mostro que, como afirma o ditado popular, um problema nunca vem sozinho, e as mudanças tecnológicas em curso também tornam crucial o debate sobre os caminhos para o desenvolvimento do país, um debate que foi abandonado desde os anos 1990, em favor da tese de que a liberalização da economia por si mesma promoveria o desenvolvimento do país.

O noticiário tem destacado o avanço da inteligência artificial (IA) e da automação nas empresas, e o seu impacto adverso sobre o emprego. Por exemplo, segundo relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) da ONU, nada menos do que um quarto dos empregos no mundo estariam ameaçados pelo avanço da IA (ver: https://www.ilo.org/pt-pt/resource/news/um-em-cada-quatro-empregos-corre-o-risco-de-ser-transformado-pela-ia ). Já a
Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento da ONU (UNCTAD), afirma que 40% dos empregos estão ameaçados pela automação (ver: https://news.un.org/pt/story/2023/08/1819507 ).

A teoria econômica chama o desemprego provocado por inovações de desemprego tecnológico. Existe realmente desemprego tecnológico? O tema é controverso entre os economistas desde o teórico que primeiro levantou a questão, o inglês David Ricardo (1772- 1823), e os estudos empíricos não oferecem um veredito decisivo. Contudo, a maioria da profissão recusa a ideia de desemprego tecnológico, pelo simples fato de que as inovações
geram novas atividades, as quais criam empregos que antes não existiam. No final das contas, o saldo de empregos seria positivo.

Por exemplo, a indústria automobilística surgida no final do século XIX liquidou o trabalho dos artesãos que fabricavam carruagens, mas criou empregos na própria indústria, na indústria de partes e peças de automóveis, no setor de seguros e no financiamento dos automóveis etc. Assim, a tese do desemprego tecnológico para a maioria dos economistas representaria um equívoco, resultante de uma visão parcial que não considera os novos
empregos criados pelas inovações.

O argumento pode estar correto, mas tanto os críticos quanto os detratores da tese do desemprego tecnológico frequentemente não levam em consideração o tipo de emprego que é criado, e a verdade é que a tendência das inovações é criar, em sua maioria, trabalhos menos qualificados e, portanto, com menor remuneração, até mesmo mais precários. Isto não significa que as novas atividades não possam criar eventualmente elites de novos profissionais muito bem remunerados, mas esta elite tende a ser pequena, e a maioria dos novos empregos criados são de menor qualidade e remuneração.

Esta tendência é uma necessidade lógica: seria muito difícil atrair capital para ser investido em uma inovação, se esta gerasse empregos que resultassem em uma folha de pagamentos mais cara do que a folha empregada pelas tecnologias que já existem, consideradas as diferenças no volume e valor da produção, antes e depois da inovação. O leitor deve estar se perguntando como isso pode ser verdade se, historicamente nos países onde a industrialização aconteceu substituindo o trabalho artesanal, a renda por habitante se elevou, o que resultou em aumento da renda do país. A verdade é que a renda se elevou porque a industrialização aconteceu nos séculos XIX e XX com mão de obra rural subempregada, que migrou do campo para a cidade, e assim melhorou seus rendimentos, mesmo sendo empregada em trabalhos menos qualificados do ponto de vista do emprego urbano. Isso não vai mais acontecer em países que precisam se desenvolver como o Brasil, porque a população é esmagadoramente urbana.

Assim, a perspectiva de países ainda em desenvolvimento como o nosso, com o avanço da IA e da automação é o do aumento de empregos precários com baixa remuneração. Alguns afirmam que essas inovações são um problema maior para países desenvolvidos, mais sujeitos à implementação dessas novas tecnologias. Pode ser verdade, mas isto não reduz o problema para o caso de países em desenvolvimento como o Brasil, que já têm um contingente elevado de trabalhadores mal remunerados e com empregos precários nas grandes cidades. Nesse caso, está se agravando um problema que já é severo.

Isso significa cada vez mais famílias sustentadas com empregos de baixa remuneração e precários, sem perspectivas, o que vai gerar problemas sociais crescentes. É fundamental discutir como preparar a economia brasileira para essa realidade, o que significa discutir desenvolvimento.

Também pelas inovações que estão chegando, a volta do debate sobre o desenvolvimento no Brasil é urgente.

Edição: domingo, 24 de agosto de 2025

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