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Ronaldo Fiani

COLUNISTA

Ronaldo Fiani

Sim, Professor Krugman: o Ouro Está Mandando um Recado


Ronaldo Fiani


O professor Paul Krugman (prêmio do Banco da Suécia em Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel de 2008), ex-professor do MIT e de Princeton fez uma postagem no início deste mês (disponível em https://paulkrugman.substack.com/p/ingots-we-trust ), acerca da ascensão impressionante do preço do ouro. Já tive a oportunidade de abordar essa elevação do preço do metal em artigo anterior (“O Enigma do Ouro”, Diário de Petrópolis, 3 de agosto de 2025, disponível em: https://diariodepetropolis.com.br/integra/colunista-ronaldo-fiani-28946) .

Como reconhece Krugman, desde novembro do ano passado o preço da onça-troy de ouro (pouco mais de 31 gramas) aumentou nada menos do que 54%, superando os 4 mil dólares. Mesmo o professor Krugman escrevendo que “normalmente, não dou muita atenção aos preços do ouro” (normally I pay little attention to gold prices), este comportamento da onça-troy de ouro chamou a sua atenção. Aqui temos um primeiro ponto: por que não dar atenção ao preço do ouro? O próprio professor explica: citando Keynes, afirma que o ouro seria uma “relíquia bárbara”, desafiando o leitor a tentar comprar uma casa com lingotes de ouro, como forma de ilustrar o fato de que ouro não é um meio de troca.

O professor Krugman está correto, mas em parte. Em primeiro lugar, Keynes se refere ao ouro como uma “relíquia bárbara” no seu livro Um Tratado sobre Reforma Monetária de 1924, em um contexto específico, aquele do período entre as duas Guerras Mundiais, quando a insistência em manter o chamado padrão-ouro (um sistema cambial que fixava o valor das moedas dos países em ouro) eliminava a liberdade dos países para administrar o valor de sua moeda. Ocorre que o momento atual é muito diferente. Não se adota mais o padrão-ouro, e os motivos por trás da valorização do ouro são outros. Sempre que estudamos a ideia de um economista do passado, é aconselhável examinarmos antes o contexto em que eles estão produzindo suas ideias.

O professor está correto ao apontar que o ouro não funciona como meio de troca, como quando, por exemplo, provoca o seu leitor a tentar comprar uma casa com lingotes de ouro. Mas servir como meio de troca não é a única função que uma moeda e ativos em geral podem desempenhar. Há uma outra função, também muito importante, que é a de servir como reserva de valor, ou seja, como um ativo que permite armazenar valor para uma data futura. Há vários ativos que podem funcionar assim: títulos públicos, títulos financeiros privados emitidos por bancos e empresas, moedas estrangeiras de países com comércio internacional importante e finanças globalizadas e, é claro, o ouro.

O que está acontecendo, portanto, não é demanda de ouro para comprar casas, ou automóveis, ou qualquer outra coisa do gênero. O que está acontecendo é a demanda de ouro como ativo, ou seja, como reserva de valor. O problema que chama a atenção mesmo de economistas como Krugman é que outros ativos, como os títulos públicos do governo norte-americano oferecem um atrativo que o ouro não oferece: taxas de juros. Como mostrei no artigo O Enigma do Ouro, bancos centrais de países como China, Índia, Turquia, Rússia e Arábia Saudita (que são os investidores que importam nestes grandes movimentos de preços de ativos, e não pessoas querendo comprar casas), estão preferindo investir em ouro, em vez de investir em títulos do governo norte-americano, mesmo renunciando aos juros. Isto é algo surpreendente, especialmente em um momento em que os juros reais (ou seja, os juros descontada a inflação) são positivos nos Estados Unidos. Na verdade, as taxas reais de juros naquele país estão próximas do seu patamar anterior à crise de 2008, conforme o gráfico que o próprio Krugman apresenta na sua postagem.

O leitor deve estar deduzindo que não é problema renunciar aos juros, desde que se espere que o preço do ouro continue subindo. A valorização que é perdida, proporcionada pelos juros acumulados é substituída (e pode ser até mesmo mais do que compensada) pela valorização do preço do metal precioso. Isto sugere que os bancos centrais dos países que mencionei podem estar criando uma tendência global, pois ao demandarem ouro elevam seu
preço, o que pode gerar ainda mais demanda por ouro como reserva de valor por parte de outros bancos centrais.

Se esta tendência se mantiver, podemos ter consequências políticas e econômicas muito graves.

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