COLUNISTA
Ronaldo Fiani
Os economistas chamam à capacidade de uma empresa de elevar o preço do seu produto acima dos seus custos, de forma a aumentar seus lucros, de poder de mercado da empresa. Quanto maior a capacidade de uma empresa de elevar seus preços acima do custo do seus produtos, maior seu poder de mercado. Para que uma empresa exerça esta capacidade, é fundamental que ela esteja, em alguma medida, protegida da pressão competitiva de seus
concorrentes. Caso contrário, a competição forçará a empresa a aproximar seus preços do custo do seu produto, reduzindo sua margem de lucro e, assim, seus lucros totais.
Ocorre que a chamada “economia digital” favorece um aumento expressivo do poder de mercado das empresas que forem bem-sucedidas. Infelizmente, como mencionei no artigo da semana passada, muitos economistas se encontram despreparados para compreender esta nova realidade, pelo seu hábito de considerar a economia real a partir da visão idealizada de uma concorrência perfeita, em que cada mercado é composto por empresas muito pequenas, e que produzem bens que são iguais uns aos outros, de forma que os compradores escolhem considerando apenas os preços.
A realidade da nova economia digital, todavia, é muito diferente. Por exemplo, empresas produtoras de celulares produzem aparelhos diferentes, e não são forçadas pela competição a igualar seus preços umas às outras, nem auferem lucros pequenos, como supõe a visão ideal da competição perfeita que muitos economistas sustentam. Conforme citei no artigo da semana passada, uma grande produtora de celulares como a Apple registrou no último
trimestre do ano passado um lucro líquido recorde de US$ 36,33 bilhões.
Também as empresas que oferecem serviços de ponta na economia digital, como plataformas de comércio eletrônico e armazenamento de dados na nuvem, encontram-se a anos- luz desse ideal perfeitamente competitivo de pequenas empresas. Para se ter uma ideia do tamanho das empresas digitais bem-sucedidas, a Amazon no ano passado teve vendas líquidas de US$ 638 bilhões, mais ou menos metade do PIB argentino (o produto interno bruto, que compreende a soma de todos os bens e serviço produzidos no ano) no ano que passou.
De onde vem o poder de mercado destas empresas gigantes? Sem, dúvida, um dos fatores determinantes do seu poder de mercado é seu tamanho, e o tamanho destas empresas resulta daquilo que os economistas chamam de economias de escala. Há economias de escala em uma atividade econômica quando o custo por unidade do bem ou serviço produzido se reduz com o aumento do volume produzido. Isto confere vantagens às grandes empresas, o que reduz o número de empresas e a intensidade da competição nos mercados.
Quais são as fontes de economias de escala nas empresas digitais? Em primeiro lugar, temos custos fixos elevados, ou seja, custos elevados para estabelecer a infraestrutura digital (os investimentos em servidores para prestar serviços na nuvem, para desenvolver softwares, plataformas etc.). Assim, volumes elevados de produção diluem estes custos, reduzindo seu peso em cada unidade produzida, o que resulta em vantagens de custos para as grandes empresas sobre as pequenas e médias. Estas vantagens reduzem a competição a poucas grandes empresas, diminuindo a pressão competitiva, e permitindo que as grandes empresas obtenham grandes margens de lucro.
Em segundo lugar, temos os chamados efeitos de escala de dados. Estes efeitos resultam do fato de que as empresas digitais bem-sucedidas coletam vastas quantidades de dados dos seus usuários e do seu mercado. Elas utilizam estes dados para aprimorar a qualidade do seu serviço, com isto atraindo mais usuários e, assim, acumulando ainda mais dados, em um círculo virtuoso que amplia cada vez mais sua base de clientes, aumentando o volume de
produção progressivamente, e reduzindo os custos por unidade produzida.
Por utilizarem serviços em nuvem, frequentemente os serviços digitais são ditos escaláveis. Diz-se que um serviço digital é escalável se ele consegue elevar rapidamente e em grande número seus usuários, sem aumentar os seus custos na mesma proporção. Desta forma, o custo por unidade do serviço prestado cai, quanto mais as empresas crescem, novamente conferindo vantagem para as grandes empresas.
Outro fator muito presente na economia digital, também conferindo vantagens para as grandes empresas são as chamadas externalidades de rede. Há externalidades de rede quando a vantagem por se tornar cliente de um aplicativo ou serviço digital aumenta, quanto maior o número de clientes que ele atende. Este fenômeno está presente, por exemplo, nas redes sociais: quanto maior o número de participantes em uma rede, maior a vantagem por participar dela, pois maior será a chance de encontrar amigos. As externalidades de rede também ampliam a escala das empresas bem-sucedidas, conferindo uma vantagem significativa para as grandes empresas digitais.
Neste contexto, como atingir a posição privilegiada das empresas digitais? Com certeza não é reduzindo preços, pois as grandes empresas têm vantagens de custos sobre as empresasque estão ingressando e, são portanto, menores. É inovando com produtos mais atraentes do que os existentes. Inovação será, mais do que nunca, a forma por excelência da competição neste novo século.
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