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Ronaldo Fiani

COLUNISTA

Ronaldo Fiani

A Digitalização da Competição Global no Século XXI


Ronaldo Fiani


No último artigo afirmei que as transformações econômicas e políticas do final do século XX tinham tornado a competição um fenômeno global, ao menos para os produtos industrializados e uma série de serviços de ponta associados à produção e comercialização destes bens. No artigo de hoje, vou mostrar como a revolução digital em curso vai acentuar e acelerar este processo.

Os economistas estão acostumados a estudar a atividade produtiva como o resultado da combinação de três tipos de insumos, ou, na terminologia econômica, fatores de produção; que são classificados de forma genérica em trabalho e capital. Trabalho é todo esforço humano diretamente aplicado à produção, podendo envolver tanto o esforço físico de um operário em uma linha de produção, quanto o esforço intelectual de um executivo no planejamento da sua indústria. Por capital entende-se tudo que não é esforço humano diretamente aplicado à produção: máquinas, equipamentos, instalações, dinheiro, estoque de matérias-primas etc. Produzir significa, portanto, escolher a forma como serão combinados trabalho e capital para gerar um produto, ou seja, definir uma tecnologia.

A produção envolve, contudo, mais do que combinar trabalho e capital para gerar um produto, ou seja, mais do escolher uma tecnologia: ela envolve também definir que etapas na produção de um bem serão realizadas pela própria empresa, e que etapas serão terceirizadas, isto é, delegadas para fornecedores, ou prestadores de serviços da empresa em questão. Apenas para citar um exemplo, uma montadora de automóveis não executa todas as etapas da produção de um carro sozinha: ela compra a bateria de um fornecedor, ao invés de fabricá-la ela mesma, e delega o serviço da venda do carro a um revendedor independente. Decidir como a produção será distribuída entre a empresa e seus fornecedores, ou prestadores de serviços significa organizar a produção.

Uma vez produzido o bem, é preciso vendê-lo, para obter a receita necessária para cobrir os custos em todas as etapas da produção, e obter um lucro que remunere aqueles que cederam o capital para a produção e que permita à empresa investir e ampliar sua capacidade produtiva, tendo em vista atender ao crescimento da demanda (se ela não o fizer, um concorrente pode absorver parcelas da sua demanda). Isto significa que é preciso encontrar onde esta demanda se localiza e atender às preferências do consumidor, o que envolve não apenas adequar as especificações do produto ao que o consumidor deseja, mas, quando for o caso, também adequar o financiamento do bem às características do mercado. Localizar a demanda e satisfazer suas preferências é atender à demanda.

É possível, portanto, dividir estas etapas em três etapas gerais, do ponto de vista econômico. A primeira etapa, a da produção em si, é a da escolha da tecnologia, ou seja da forma como serão combinados trabalho e capital. A segunda etapa é a da organização da produção e a terceira etapa é a do atendimento da demanda. A divisão nestas três etapas é meramente ilustrativa, para que o leitor compreenda todo o processo. Na prática, as três etapas são definidas a todo instante conjuntamente, e se influenciam mutuamente.

Um fator que foi ignorado até agora pelos economistas é que as três etapas demandam um outro fator de produção, ou insumo: informação. As tecnologias empregadas na produção utilizam diferentes conjuntos de informação sobre o processo produtivo (a tecnologia de produção típica do século XIX empregando o vapor envolve informações sobre o processo produtivo diferentes da tecnologia que emprega eletricidade, por exemplo). Da mesma forma, a organização da produção exige informações sobre a capacidade e as características dos fornecedores e prestadores de serviços, e o atendimento da demanda pede informações sobre o mercado consumidor.

Informação sempre foi um problema quando se tratava de competir internacionalmente, o que ajudou a justificar o estabelecimento de filiais de grandes empresas no exterior, as chamadas empresas multinacionais. Mais próximas aos mercados consumidores de países estrangeiros, elas eram capazes de obter as informações para ajustar sua tecnologia, organizar o processo produtivo e atender à demanda da forma mais lucrativa possível.
Mas a revolução digital está permitindo de forma crescente que as empresas multinacionais acessem um volume impensável de informações de modo cada vez mais rápido e detalhado, o que está tornando a informação um fator de produção independente. Assim, está se tornando possível: (1) elevar a eficiência da operação de uma tecnologia produtiva com o emprego de equipamentos digitais, o que permite ampliar ainda mais a escala de produção; (2) coordenar a operação de fornecedores e prestadores de serviços globais à distância, com a troca de informações em tempo real e o controle da atuação destes fornecedores e prestadores pela internet das coisas (a conexão de equipamentos via internet em rede global); (3) identificar de forma rápida e precisa as preferências dos consumidores, atendendo a especificidades da demanda sem perda na escala de produção.

Tudo isto vai permitir às empresas atingirem uma escala cada vez mais global. A competição no século XXI será internacional e digital. As indústrias que permanecerem presas aos modelos tradicionais não vão sobreviver.

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