Pe. Anderson Alves
A distinção entre esperança teologal e esperanças humanas é crucial para uma compreensão adequada da virtude cristã. A teologia moral alerta para os riscos de supervalorizar uma em detrimento da outra, ou de confundir a salvação prometida por Cristo com um mero melhoramento da vida terrena. A bula Spes non confundit do Papa Francisco oferece uma perspectiva equilibrada, reconhecendo a legitimidade das aspirações humanas enquanto as eleva e as orienta para a esperança última em Deus.
Francisco reconhece que “todos esperam”, albergando no coração o desejo e a expetativa do bem, apesar da imprevisibilidade do futuro. Esta observação valida a existência e a importância das esperanças humanas por paz no mundo, por um futuro para os jovens, por justiça para os pobres, por acolhimento para os migrantes, por dignidade para os idosos e os presos. O Papa não despreza estas esperanças; pelo contrário, chama a comunidade cristã a ser sinal palpável de esperança para muitos irmãos e irmãs que vivem em condições de dificuldade.
No entanto, a esperança proclamada no Jubileu transcende estas aspirações temporais. Ela se ancora na fé em Jesus Cristo, “nossa esperança” (1 Tm 1, 1), no amor de Deus derramado em nossos corações, e na certeza de que nada pode nos separar desse amor. A esperança teologal purifica as esperanças humanas para ordená-las ao Reino dos Céus, protegendo contra o desânimo e dilatando o coração na expectativa da bem-aventurança eterna (CEC 1818).
Spes non confundit ilustra esta purificação e ordenação ao convidar a descobrir a esperança também nos sinais dos tempos, interpretando-os à luz do Evangelho. As necessidades de paz, de respeito pela vida, de justiça social, de fraternidade esperanças profundamente humanas são apresentadas como caminhos para testemunhar a presença de Deus no mundo, como sinais de uma esperança maior que se cumpre plenamente na vida eterna com o Senhor.
O Papa Francisco, ao recordar a importância de “Crer na vida eterna”, estabelece o fundamento último da esperança cristã. As esperanças terrenas, por mais legítimas que sejam, encontram seu pleno sentido e sua verdadeira força quando orientadas para este horizonte eterno. O Jubileu é, assim, uma ocasião para reanimar não apenas as esperanças de um futuro melhor neste mundo, mas fundamentalmente a esperança naquele encontro definitivo com o Senhor da glória, onde a felicidade humana encontrará sua plenitude no amor de Deus.
Em conclusão, Spes non confundit reconhece o valor intrínseco das esperanças humanas, mas as inscreve num horizonte muito mais vasto e profundo: a esperança teologal, ancorada no amor de Deus revelado em Cristo e na promessa da vida eterna. O Jubileu é um convite a viver as esperanças terrenas com um olhar voltado para o Céu, encontrando nelas sinais da presença de Deus e um impulso para construir um mundo mais justo e fraterno, antecipação do Reino definitivo.
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