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Liberdade para educar

- Ataualpa A. P. Filho

Foto: Freepik
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O tempo é que apara as nossas arestas.  A dor desse processo depende da nossa resistência em relação às mudanças impostas por ele. Já fui mais resistente, principalmente na juventude, quando as inflexibilidades ideológicas eram mais fortes. Não perdi as minhas convicções, mas tive que aprimorar a linguagem para dizer o que sinto e o que penso. A realidade que exige discernimento.

Na década de 70, cantava, sem entender, “Jura Secreta” de Sueli Costa e Abel Silva. O “meu disco” travava nos seguintes versos da canção: “só uma palavra me devora/ aquela que o meu coração não diz”. Nesse período, eu não sabia ouvir o silêncio. Foi tateando pelas entrelinhas, que passei a entender o dito não verbalizado. O discurso das ações é o que mais revela o que há nos corações. A linguagem do carinho é assimilada por todos os viventes, sejam considerados racionais, ou irracionais. O carinho toca o coração, a mente e a alma.

Como em diversos frutos, o amadurecimento é que traz a doçura e a maciez das polpas. O tempo exerce, no silêncio, transformações. Ele é o lente que conduz a lente sobre a realidade. É ele que nos faz enxergar melhor o que vem do coração.

Para a nossa reflexão de hoje, transcrevo um diálogo que Jesus teve com os apóstolos:

“Não sabeis que o que entra pela boca desce ao estômago e é evacuado para o esgoto? Mas o que sai da   boca provém do coração, e isso torna a pessoa impura. Porque do coração provêm os maus pensamentos, os homicídios, os adultérios, a prostituição, os roubos, os falsos testemunhos, as calúnias. É isso o que torna alguém impuro. Mas comer sem lavar as mãos, isso não torna ninguém impuro.” (Mt 15, 17-20)

A partir desse diálogo, com o propósito de ampliar nosso processo reflexivo, trago um trecho do “Opúsculo Sobre a Educação”, escrito em 1877, por um padre que evidenciou a necessidade de “educar o coração”.

“A poesia, a música, as representações dramáticas, artísticas, as cenas de mil diferentes coloridos, nobres invenções da inteligência humana; são todas destinadas, até com fins políticos, a entreter os povos e muitas vezes, empregadas como meios de distrair as massas e ondas populares em momentos críticos. Mas tudo é vão, tudo é inútil se lhes falta a educação do coração, o amor e o respeito ao Ente Supremo, ao autor da nossa existência”.

O padre a que me refiro chama-se João Francisco de Siqueira Andrade, nascido em Jacareí, São Paulo, em 1837. Foi ordenado em 08 de dezembro de 1864, portanto, neste mês, comemoram-se os 160 anos dessa ordenação, por isso que as Irmãs Franciscanas da Congregação de Nossa Senhora do Amparo estão em festa. Ele fundou, em 1871, em Petrópolis, a Escola Doméstica de Nossa Senhora do Amparo. E alicerçou essa congregação, tão bem estruturada pela sobrinha dele, a Irmã Francisca Pia, que sabiamente afirmou: “a Educação enfraquece a inclinação para o mal e fortifica-a para o bem.”

Converter-se ao bem é um ato de coragem, pois exige um esforço hercúleo, uma vez que é necessário abandonar a vaidade, a inveja. É preciso amar mesmo sem ser amado para vencer o ódio e suplantar o sentimento de vingança.

A sensatez que leva à temperança requer o exercício da justiça para que direitos e deveres sejam comuns a todos, por isso, despertar a sensibilidade humana é um ato de sabedoria. As virtudes não brotam nas pedras, mas na natureza humana. Precisam das nossas ações para florir. São gêneros de primeira necessidade assim como arroz e feijão. Não é só o corpo que necessita de alimento. A vida em sociedade também precisa ser nutrida de bons hábitos para manter-se saudável. Em nossa cesta básica, precisamos ter alguns itens como: honestidade, respeito, empatia, gratidão, resiliência, ponderações...

Em 1868, o Padre Siqueira, hoje considerado Servo de Deus, dirigiu-se ao Imperador Dom Pedro II para expor o desejo de construir uma escola para meninas carenciadas:

“Esforço-me para ver realizado o meu pensamento, confiando em Deus, em Vossa Majestade e no povo brasileiro, cuja caridade não me há de faltar. A educação de um povo, senhor, não está somente nos estudos que levam ao caminho das Ciências. Cada um para o que nasceu e conforme as suas condições. O pobre precisa do trabalho como riqueza, para isso, a instrução apropriada, o costume e a moralidade se tornam indispensáveis.”

Ele queria liberdade para educar e educar para a liberdade. A Educação liberta, porque mostra a face da verdade.

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