“O tratamento da obesidade é resgatar a saúde física e mental daquele indivíduo, e, muitas vezes, nessa saúde mental, a saúde emocional de cada um, resgatando a autoestima”, diz médica
Mariana Machado estagiária
A Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso) apresentou a nova Diretriz Brasileira para o Tratamento Farmacológico da Obesidade, caracterizada como uma doença crônica pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
A diretriz orienta médicos, gestores de saúde e profissionais de diferentes especialidades sobre o uso adequado de medicamentos.
Em todo o país, de acordo com dados da Abeso, 19,8% dos brasileiros eram obesos em 2019. No estado do Rio de Janeiro, 20,1% dos homens e 23,1% das mulheres eram obesos na época.
Para a endocrinologista e professora da Faculdade de Medicina de Petrópolis, Gisele Hart, o mundo é gordofóbico, e, com a nova diretriz, passa-se a ter mais respeito pelo paciente obeso. “A obesidade precisa ser controlada. Tendo uma diretriz de conduta, nós conseguimos tirar a exposição que os pacientes obesos sofrem com médicos picaretas que querem se dar bem e ter lucro em cima da obesidade. A gente consegue fazer um tratamento da doença obesidade, preservando o indivíduo, tratando com respeito e com ciência acima de tudo”, afirma.
A endocrinologista explica que o corpo humano é programado para um peso mínimo e máximo de cada indivíduo, de acordo com o cálculo do IMC, isso porque cada um tem uma estatura e peso dos ossos específico e único. “Quando você tem uma estrutura de esqueleto programada para aquele corpo, e excede o peso com gordura, você passa a ter dor articular, inchaço nas pernas, diminuição da circulação, falta de ar por compressão das vísceras, por falta de expansibilidade do pulmão. O tratamento da obesidade é muito mais do que apenas emagrecer o indivíduo, é resgatar a saúde física e mental daquele indivíduo, e, muitas vezes, nessa saúde mental, a saúde emocional de cada um, resgatando a autoestima”, diz Gisele.
Quanto aos principais riscos da obesidade, a especialista ressalta que a doença pode causar uma variável muito grande de problemas para a saúde. De acordo com ela, “a obesidade por si só leva a doença hepática gordurosa, apneia do sono, doenças articulares, do sistema circulatório, cardíacas, pulmonares por falsa expansibilidade, de pele, porque começam a estourar úlceras nas pernas, pequenas lesões em tronco, dificuldade de fertilidade. Então, várias coisas a obesidade traz consigo, fora as questões de morte: morte súbita por infarto agudo, acidente vascular cerebral, até acidentes vasculares hemorrágicos”.
O tratamento da obesidade é multidisciplinar. Gisele explica que “a primeira leitura na endocrinologia entende quem é o indivíduo, a história familiar dele, desde a história do nascimento, se já era obeso quando criança, quais são os hábitos alimentares, como é a rotina dessa pessoa. Então com esse compilado pode-se traçar um direcionamento. Logo depois dessa conversa, de todo o exame físico e os exames complementares, com as informações necessárias e com o padrão alimentar, a gente trata com medicamento, com uma dieta balanceada e com atividade física na medida do possível que aquele peso vai permitindo, e acima de tudo, uma excelente relação médico paciente. Além disso, o paciente precisa, muitas vezes, fazer psicoterapia para poder ir se reestruturando até chegar na obesidade controlada”.
De acordo com a especialista, muitas coisas podem levar à obesidade, como causas genéticas, saúde mental, medicamentos que induzem obesidade, entre outros. Entretanto, algo que ela reforça é que a obesidade não é “falta de vergonha”, pois, segundo afirma ela, “antigamente os obesos eram tratados como tem falta de vergonha na cara, ‘é só parar de comer, fazer exercício que emagrece’. Então, é esse conceito que não pode ficar mais na nossa mente”.
Sobre as mudanças geradas pela nova diretriz, a endocrinologista ressalta estas: “o paciente que tem sobrepeso, a gente já tem que tratar, mesmo com o IMC abaixo de 30, para diminuir os riscos desconhecidos que essa obesidade pode trazer. Os índices de cirurgia bariátrica também mudaram, os obesos passaram a ser indicados à cirurgia bariátrica mesmo naqueles pacientes com IMC de 30, sem outras comorbidades juntas. Outros critérios para avaliação entraram, por exemplo, a gente sempre usou muito a circunferência abdominal, mas a circunferência do pescoço também se tornou muito importante, a bioimpedância entrou como um auxiliar também, não só o IMC. Para a gente poder definir, porque antes a gente tinha uma definição de obesidade muito limitada, e era considerado normal até 25 o IMC”.
Segundo a Abeso, o documento representa um marco para a prática clínica no país ao reconhecer a obesidade como uma doença crônica que requer cuidado contínuo e abordagem individualizada.
Veja também: