Têxtil e turismo, por exemplo, podem sofrer efeitos indiretos
Larissa Martins
Desde essa quarta-feira (6), estão em vigor as novas tarifas de importação de 50% aplicadas sobre os produtos brasileiros pelos Estados Unidos da América (EUA). A medida, assinada na semana passada pelo presidente norte-americano Donald Trump, que afeta parte das exportações brasileiras, entre elas, de frutas, café e carne, tem gerado preocupações em alguns setores da economia de Petrópolis. Mesmo sem grande vocação exportadora, a cidade deve sentir os efeitos em áreas estratégicas, sugerem entidades.
A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) reitera a importância da continuidade do diálogo entre governos, com apoio do setor empresarial, para a busca de soluções negociadas e que preservem o ambiente de negócios e investimentos entre os países.
O cenário atual promove insegurança ao comércio e prejuízos à competitividade e atuação das empresas fluminenses no mercado internacional, em especial aos pequenos e médios empresários. No estado do Rio de Janeiro, as micro e pequenas empresas são 38% das empresas exportadoras e respondem por 4% (US$ 311 milhões) do valor total exportado pelo estado.
Observando o cenário do estado do Rio de Janeiro, a estimativa da Firjan é de que 2% das exportações fluminenses estarão sujeitas às tarifas implementadas hoje, com base nas exportações totais de 2024.
Ao ampliar a análise, observa-se reflexos em produtos dos setores de Alimentos e Bebidas, Gráfico, Borracha, Pedras Ornamentais, Plástico, Químico, Têxtil e Pescado. Em especial, é necessário atentar também para efeitos indiretos ao longo da cadeia produtiva, principalmente no que tange às atividades das pequenas e médias indústrias. Estima-se que o impacto no PIB (Produto Interno Bruto) do estado do Rio de Janeiro estaria em torno de R$ 123 milhões.
Ainda segundo estudo da Firjan, cerca de 67% das exportações para o mercado no norte-americano estão entre os produtos listados como exceções à tarifa, destacadamente a cadeia de óleos de petróleo. Além disso, 31% permanecem submetidas às tarifas específicas previstas para produtos do setor de Aço, Alumínio e Automotivo.
Nesse contexto, a Firjan reforça a importância da mobilização de entes públicos e privados para formulação de iniciativas de apoio às empresas afetadas, de forma que seja possível mitigar os impactos em receita e arrecadação, mas, principalmente, proteger postos de trabalho.
Mais uma vez, vale ressaltar o longo e frutífero histórico de relações diplomáticas e comerciais entre Brasil e EUA. Os EUA são o principal investidor externo direto no mercado brasileiro e o segundo maior parceiro comercial do Brasil, registrando superávit de US$ 7 bilhões em relação ao Brasil em 2024.
Por fim, a Firjan reitera seu posicionamento pela intensificação da atuação diplomática e paradiplomática em diversos níveis para construção de uma solução negociada e célere para mitigação dos impactos econômicos e sociais das novas tarifas anunciadas.
Tarifaço impõe desafios
Na visão da ACEP (Associação Comercial e Empresarial de Petrópolis), mesmo não sendo impactado diretamente, o "tarifaço", impõe desafios à economia do município com riscos para empregos e investimentos.
“Segmentos afetados diretamente como o têxtil apontam que os 50% adicionais sobre os produtos brasileiros podem forçar ajustes na produção e até inviabilizar exportações, segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit). No caso do mercado emergente das cervejarias artesanais, pode bloquear planos de expansão e construir um novo planejamento para redirecionar os produtos para outros destinos”, analisa Roberto Musser, Diretor de Inovação e Novos Negócios da ACEP, engenheiro, mestre em administração estratégica e doutor em energia e ambiente. “Para a ACEP o cenário segue com incertezas subjetivas do comércio internacional e nesse momento a colaboração entre governo, iniciativa privada e entidades representativas é fundamental para preservar empregos, manter competitividade e garantir o desenvolvimento econômico”, acrescenta.
Possível crise no turismo
Um dos pilares econômicos de Petrópolis, o turismo, pode ser um dos principais a sentir os impactos da medida.
“O maior alerta recai sobre o turismo. Caso o desemprego aumente em outras regiões do país, a redução no poder de compra pode afetar o fluxo de visitantes, comprometendo o comércio, a hotelaria e os serviços, pilares da economia petropolitana. Além disso, há risco de volatilidade nacional, com queda na confiança do consumidor e pressão sobre custos operacionais do varejo, sobretudo em setores dependentes de produtos manufaturados ou tecnologia importada”, analisa Cláudio Mohammad, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Petrópolis.
Produtos excluídos
A decisão dos EUA excluiu da lista quase 700 produtos como, por exemplo, o suco e polpa de laranja, combustíveis, fertilizantes e aeronaves civis, seus motores, peças e componentes, o que deve beneficiar algumas empresas.
“No setor de aviação, a isenção da GE Celma maior empregadora local foi positiva, evitando impactos diretos no mercado de trabalho. Já na indústria têxtil, com poucas empresas exportadoras, pode haver algum efeito, embora limitado”, diz Mohammad.
O Diretor da ACEP reforça o que é dito por Cláudio. “A GE Celma não deve ser diretamente afetada pelas tarifas, em sua maioria isenta, mas de qualquer forma o ambiente internacional instável pode levar à revisão de contratos e comprometer investimentos, afetando empregos e receitas de Petrópolis”, pontua Musser.
Oportunidades
Apesar do cenário, a ACEP também vê uma “janela de oportunidades” para Petrópolis.
“Os incentivos e compensações inicialmente anunciados pelo governo brasileiro para mitigar os impactos nas cadeias produtivas observados nas três alternativas postas: barreiras tarifárias, retaliação e alteração de preços de matérias-primas, surge como uma janela de oportunidades para a transformação econômica de Petrópolis tornando competitiva e atraente para novos mercados. A ACEP aguarda o desenrolar das decisões e promoverá ciclos de debates no apoio os empreendedores locais em ambientes competitivos articulando empresários, sociedade e academia em projetos inovadores, desenvolvimento de competências e consultorias”, declara Roberto Musser.
No setor de tecnologia, a visão é parecida
“O impacto das políticas tributárias impostas pelos Estados Unidos, em nossa leitura, gera alguns desafios para o setor de TIC brasileiro, porém algumas oportunidades também - e isso dependerá, em nossa visão, de como as empresas brasileiras executarão estratégias de diversificação e ainda de como o governo trabalhará para manter a estabilidade regulatória e o investimento (tanto público quanto privado) em capacitação tecnológica. Acreditamos que o setor de hardware, por ser mais dependente de itens como sensores, placas e baterias, pode ser mais vulnerável que o de software - que é o perfil principal das empresas que formam o nosso arranjo produtivo de TIC na Região Serrana do Rio. As empresas que atuam no setor de software podem ser afetadas pela possível retração da demanda, aumento de custos com infraestrutura de nuvem, decorrente da alta dos insumos, e dificuldades de repasse de custos, por exemplo. Tais mudanças também podem provocar aumento do desemprego no setor. Por outro lado, crises podem gerar janelas de oportunidades. O chamado "tarifaço" dos EUA atinge não apenas o Brasil, mas outros países. Concorrentes asiáticos, como a China, enfrentam tarifas ainda mais altas, podendo posicionar o Brasil como uma alternativa mais viável no cenário internacional, desde que os produtos nacionais mantenham uma vantagem de custo relativa e ofereçam soluções com maior valor agregado, também no setor de TIC. A diversificação de acordos internacionais é urgente, requerendo maior protagonismo do governo brasileiro. A inovação aberta é também um caminho para fortalecer empresas e instituições que atuam com tecnologia e inovação por promover colaboração, desenvolvimento de novos produtos e melhoria de processos e, consequentemente, aumento da competitividade e compartilhamento de riscos entre os atores. Por fim, as iniciativas de capacitação de talentos, como Residência em TIC, desenvolvida pelo Serratec e parceiros, aumentam a competitividade do setor brasileiro neste cenário e em cenários futuros”, diz Alexandre Macedo - Presidente do Serratec.
Em nota enviada ao Diário, a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio) do Rio de Janeiro afirma que o momento é estratégico.
“Com a retirada de alguns produtos da lista do Tarifaço, a tarifa absoluta média aplicada caiu de 50% para algo próximo de 30%, representando a redução do impacto potencial sobre as exportações brasileiras, estimadas em mais de US$ 40 bilhões, para uma faixa entre US$ 20 e US$ 25 bilhões. A Fecomércio RJ defende a prioridade no aproveitamento da maior oferta interna para controlar preços domésticos e expandir mercados, e não adotar medidas paliativas que apenas elevam gastos com pressão inflacionária. O momento é estratégico para promover programas como o Made in Rio e reforçar a agenda exportadora com inteligência comercial, previsibilidade e confiabilidade institucional”, afirma.
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