A Câmara Municipal de Petrópolis realizará, no dia 5 de agosto, às 19h, uma audiência pública com o tema “Titulação do Tapera Debatendo Terra, Memória e Regularização Fundiária”, promovida pela vereadora Júlia Casamasso. A atividade tem como objetivo fortalecer o apoio institucional e popular à titulação das terras do Quilombo da Tapera, localizado no Vale do Cuiabá, em Itaipava, e ampliar o debate sobre direito à terra, memória e reparação histórica.
A audiência é resultado de uma construção coletiva entre o mandato e a comunidade, fruto de um trabalho comprometido com a escuta, a valorização da memória e o enfrentamento das desigualdades raciais e territoriais e garantia de direitos. Fundada em 1847, ainda nos primeiros anos da cidade, a Comunidade recebeu a doação testamentária feita à lavradora alforriada Sebastiana Augusta da Silva Correia, figura central na formação da comunidade. Desde então, o Tapera resiste mesmo diante das tentativas de remoção, de retomada das terras por parte de uma elite, da invisibilização histórica e das tragédias socioambientais que marcaram a região, como o desastre de 2011.
Em 2011, após o desastre socioambiental que atingiu a Região Serrana, a comunidade se reorganizou e buscou o reconhecimento formal como remanescente de quilombo. Ainda naquele ano, conquistou a Certidão de Autorreconhecimento emitida pela Fundação Cultural Palmares. Em 2013, teve início o processo de regularização fundiária junto ao INCRA, por provocação do Ministério Público Federal. A área reivindicada, de cerca de 594 hectares, localiza-se no bioma da Mata Atlântica, nas nascentes do Rio Santo Antônio, afluente direto do Rio Piabanha.
Apesar desses marcos legais e institucionais, o processo segue sem conclusão. A comunidade enfrenta até hoje a ausência de políticas públicas estruturantes e o descaso do poder público com os seus direitos fundamentais. O direito à terra quilombola é garantido pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Igualdade Racial e pela Convenção 169 da OIT, ratificada pelo Brasil. A morosidade na titulação das terras do Tapera evidencia a persistência do racismo institucional nas instâncias de decisão e reforça o caráter seletivo das políticas públicas no país, bem como a necessidade de um debate sério e favorável ao povo sobre o direito à terra.
Segundo Denise Barbosa, liderança da comunidade do Tapera, o processo de titulação enfrenta entraves graves. “O nosso processo está atrasado porque um servidor que era responsável por essa parte foi removido do INCRA, por isso estamos com a publicação do nosso RTID no Diário Oficial do Estado do RJ atrasado. Pra mim isso é mais que um problema, mas sim um desrespeito com nossa comunidade que aguarda ansiosamente. Se é barulho que eles querem, é barulho que eles vão ter.”
Nos últimos anos, o mandato da vereadora Júlia Casamasso tem atuado em parceria com os quilombolas em diferentes frentes, como a criação da Comissão Especial da Memória Negra e Trabalhadora, a realização de visitas ao território, e a apresentação do Relatório da Memória Negra e Trabalhadora de Petrópolis com uma sessão especial que conta parte da história da Comunidade, que reconhece institucionalmente a existência do quilombo e denuncia as violações sofridas pela comunidade. Durante o lançamento do relatório, realizado no dia 8 de julho de 2025, a vereadora também apresentou uma Moção de Apoio à Titulação das Terras da Tapera, com ampla adesão popular e institucional incluindo a OAB, o NEABI, o coletivo AFROSERRA e outras entidades e movimentos sociais, no dia seguinte a mesma foi protocolada e aprovada na Câmara Municipal.
“A titulação das terras do Quilombo da Tapera é um passo fundamental na luta pelo direito à terra garantido pela Constituição, mas o que vemos é a morosidade e o descaso do Estado diante desse processo. Defender a Tapera é defender a memória negra, o direito à permanência no território e o fortalecimento das comunidades tradicionais. Sem terra não há liberdade, não há segurança e não há futuro. Essa audiência é mais um marco de resistência e de mobilização popular em defesa de um modelo de cidade e de país onde o povo tenha vez, voz e chão”, afirma a vereadora Júlia Casamasso.
A audiência do dia 5 será aberta ao público e contará com a participação do ICMBIO, INCRA, ACQUILERJ, o Secretário de Governo e o Secretário de Planejamento e Orçamento, a Advogada de Direitos Humanos Cecília Vieira e as Lideranças Quilombolas Denise Barbosa e Adão Casciano. A proposta é promover o diálogo entre diferentes atores, cobrar celeridade no processo de titulação do Quilombo e ampliar o debate sobre o processo de regularização fundiária de diversas terras na cidade.
Denise destaca a importância da audiência como mais um marco na luta do Tapera. “Essa audiência pública vai ser de suma importância no fortalecimento, organização e engajamento da nossa comunidade, que luta pela defesa de nossos direitos e pela garantia de um futuro sustentável do nosso território. Vai dar mais evidência à nossa luta por nossos direitos à terra, pois enquanto a nossa titulação não sair do papel, vão continuar violando os nossos direitos. Não estamos pedindo nada de mais, pois a terra já é nossa por direitos.”
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