Cidade teve 706 casos registrados pela Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos em três meses e meio
Rômulo Barroso - especial para o Diário *
O caso de uma mulher que levou um idoso morto para pegar um empréstimo em uma agência bancária no Rio chamou a atenção e chocou o mundo inteiro nessa semana. Um vídeo gravado por funcionários do banco mostra Érika de Souza Vieira Nunes pedindo que o tio Paulo Roberto Braga, de 68 anos, já sem vida, segurasse a caneta para assinar o contrato e ter acesso ao dinheiro. A investigação não conseguiu ainda garantir se o óbito ocorreu antes ou depois da entrada na instituição financeira, mas ainda assim, a vulnerabilidade da vítima é clara. E esse é um problema grave em todo país e que também se repete em Petrópolis.
De acordo com dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), foram registradas 706 ocorrências de violência contra pessoas de 60 anos ou mais de janeiro ao dia 14 de abril. Trata-se do segundo grupo mais vulnerável na cidade, atrás apenas da mulher. A quantidade de violações aos direitos das pessoas idosas representa 29,8% do total relatado no município nesses três meses e meio e o mais alto já demonstrado pelo órgão nesse período. Em 2023, foram 689 casos; um ano antes, 257; em 2021, 230; e no ano da pandemia, 364.
Detalhes dos números
Os números disponibilizados pelo ONDH ajudam a entender a vulnerabilidade dos idosos na cidade. Grande parte dos casos de violência ocorreu na casa da vítima (344) ou onde moram vítima e suspeito (287).
A demora até que uma denúncia seja feita é muito grande: a maior quantidade de registros são de ocorrências que aconteciam há mais de um ano (278); em segundo lugar, aparecem casos em que a vítima já sofria há mais de uma década (95 casos). E essa violência é frequente: em 543 casos, ela ocorria diariamente.
Uma das possíveis explicações para a demora pode ser o fato de que o principal suspeito de ser o responsável pela violência é o próprio filho (424), número que é bem mais alto que todos os outros suspeitos somados (vizinhos, funcionários, outros familiares, companheiros, cuidadores, etc): 282. A dificuldade é tamanha que a maior parte dos casos é denunciada por terceiros (536), enquanto a própria vítima relatou apenas 170 ocorrências.
As mulheres são aquelas que mais sofreram com violências (513, contra 179 casos cometidos contra homens).
Dos casos de violações contra os idosos, 656 foram contra a integridade: psíquica (277), física (264), negligência (80) e patrimonial (35). Também houve 31 violações de direitos sociais, nove contra a liberdade, sete contra direitos civis ou políticos, dois contra igualdade e uma violência institucional.
O que explica a violência contra idosos
"As famílias podem cometer esses crimes por falta de conhecimento e de preparo ao cuidar de pessoas fragilizadas. A falta de informação, de divulgação sobre a legislação, traz dificuldades nesse cuidado. As condições de vida, como o desemprego, também favorecem as pessoas a cometerem determinados crimes, como empréstimos consignados, extorsão, pressão sobre os idosos, violência psicológica. Outra questão é a exaustão sobre o cuidado de idosos, fragilizados ou com síndrome demencial. Isso pode prejudicar muito os relacionamentos dentro das famílias", analisa a coordenadora de projetos de extensão do Núcleo de Envelhecimento Humano da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e presidente do Departamento de Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), Sandra Rabello, em entrevista à Agência Brasil.
Para ela, é necessário "entender que há dimensões coletivas na violência contra os idosos, que começam com exclusão e invisibilidade. Falta um olhar mais atento da sociedade e ações mais concretas de órgãos públicos para fiscalizar o cuidado dos idosos".
A presidente da Comissão de Atendimento à Pessoa Idosa da Ordem dos Advogados do Brasil-RJ, Fatima Henriette de Miranda e Silva, entende que é necessário ações educativas para prevenir a violência contra os mais velhos. "Para prevenir essas violências, entendo ser necessário investir em educação e conscientização sobre os direitos dos idosos, promover o diálogo e o apoio dentro das famílias, proporcionar serviços de assistência social e psicológica para os idosos em situação de vulnerabilidade", diz. Ela considera "Importante ter campanhas, políticas públicas, com participação de governantes, familiares e toda a sociedade" e orienta:
"Vítimas, familiares ou qualquer pessoa que testemunhe casos de abusos, denuncie imediatamente às autoridades competentes, como delegacias especializadas em proteção do idoso, o Ministério Público ou o Disque 100. Também estão sendo recebidas queixas nas delegacias de bairro", reforça.
*Com informações de Agência Brasil
Veja também: