Saúde Mental Psicanalista Lenilson Ferreira
Conviver com alguém que sofre de depressão é um desafio para qualquer pessoa, principalmente antes de iniciar a terapia com um psicanalista e haver a avaliação de um médico psiquiatra.
O Grupo de Apoio à Pessoa com Ansiedade e Depressão (GAP) dá suporte gratuito todos que necessitam de orientação. A informação correta é o primeiro passo para enfrentarmos um transtorno emocional.
Meu contato com pessoas que convivem com quem sofre de Transtornos Emocionais vem de longa data, mas ganhou escala quando iniciei meu trabalho social com o Grupo de Apoio à Pessoa com Ansiedade e Depressão(GAP) em 2010. Objetivo do grupo é de orientar as pessoas sobre como lidar com os dois transtornos mentais que mais incapacitam seres humanos. Desde nossa primeira reunião em uma biblioteca pública, percebi que cerca de dois terços dos presentes eram pessoas que buscam orientação para ajudar alguém que sofria de ansiedade e/ou de depressão.
“Eu não sei mais o que fazer!”. Estas foram algumas das palavras que mais tenho ouvido nos 15 anos de existência do GAP. Geralmente, são pessoas que estão angustiadas por causa do forte stress que têm vivido no contato com a ansiedade e a depressão. Muitas dessas pessoas chegaram ao grupo trazidas por amigos ou parentes porque elas não entendiam o que estava acontecendo com a pessoa que desejavam ajudar.
Nas reuniões do GAP é muito comum vermos pessoas que dizem ter depressão. Quando pergunto qual profissional da saúde mental confirmou o diagnóstico elas com frequência me olham surpresas e dizem que simplesmente sabem que têm depressão. Não consultaram um especialista. Esta realidade preocupante é fruto da enorme difusão das doenças mentais entre a população. Houve uma época em que apenas profissionais da área ou pessoas que lidavam com quem sofria dessas doenças estavam familiarizados com expressões como Transtorno de Ansiedade, Depressão, Síndrome de Pânico e Bipolaridade. A difusão desses termos através da mídia e, principalmente, através da internet a partir da década de 1990, contribuiu para a popularização e para a confusão que vemos entre a população leiga quando ao significado dessas graves doenças.
É comum ouvir pessoas falarem que tiveram depressão, mas não têm mais. “Eu tive uma depressão muito forte na semana passada, mas passou. Esta fala ilustra muitas e muitas outras vezes que vivi uma situação semelhante. Esta situação ilustra perfeita a ignorância que costuma cercar essas doenças. Não é possível ter depressão em uma semana e não ter mais na semana seguinte. O que costuma acontecer nessas situações é que esta pessoa viveu uma situação de extrema tristeza, geralmente causada por algum tipo de perda, e, aos poucos, esta tristeza foi se esvaindo. A forte tristeza foi confundida com uma depressão. É importante lembrar que a tristeza normal é passageira, tende a sumir sem que o indivíduo busque qualquer tipo de suporte profissional. A bem da verdade, é importante frisar que não há tratamento para a tristeza por ela ser uma circunstância natural da vida. Por outro lado, quando a tristeza surge como um sintoma da depressão, ela não desaparecerá apenas com o passar do tempo. O preconceito, por sua vez, é um outro obstáculo gigantesco para a procura de ajuda. Onde há depressão sempre há tristeza, mas onde há tristeza pode haver apenas tristeza...
Todos os dias recebo mensagens de várias partes do Brasil enviadas por pessoas que sofrem doenças mentais e que perguntam se não há um grupo no WhatsApp para dar lhes apoio. Nesses casos, encaminhamos imediatamente para o Centro de Valorização da Vida através do telefone 188 com ligações gratuitas. Esta fantástica instituição tem voluntários para escutar a fala de todos 24 horas por dia. Nas redes sociais, vemos autênticas redes de ajuda mútua entre pessoas que têm ou que acreditam ter depressão. Infelizmente, muita orientação incorreta é dada a quem precisa de apoio profissional.
Por que há quem creia em orientação de pessoas não especializadas ao invés de procurar um profissional? Creio que a primeira razão que devemos ter em mente para entender esta questão é o preconceito. A depressão é uma doença estigmatizada. Todas as épocas da história da humanidade tiveram doenças estigmatizadoras. A lepra (hanseníase), a varíola, a tuberculose e HIV/AIDS são exemplos de doenças que estigmatizaram multidões em determinada época de nossa história. Infelizmente, depressão ainda é associada a falha de caráter, a fraqueza mental (o que quer que seja que isto signifique), a falta de vergonha na cara, a preguiça e até mesmo a falta de fé. Neste cenário horripilante, é compreensível que muitos temam o dignóstico e até mesmo o neguem. Esta realidade nos ajuda a entender o porquê de muitos preferirem a opinião do leigo à opinião do profissional. Atitude que pode ter efeitos nefastos e devastadores sobre a saúde mental e mesmo a saúde física de quem sofre.
Ter o diagnóstico é o segundo passo para iniciar-se o enfrentamento. O primeiro é a obtenção de informação, a qual se mistura com uma certa conscientização. Não se busca ajuda se não se considerar estar doente. Pessoas que não têm doenças não precisam de tratamento. O que fazer quando se tem uma doença que é frequentemente confundida com a personalidade da pessoa? Uma paciente me falou repetidamente em nossas sessões no consultório que sua família e seus amigos sempre disseram que ela era “muito pra baixo”. “Eu me sinto assim desde que eu me entendo por gente. Eu sempre pensei que isto fosse parte de minha personalidade e que não havia nada a ser feito”, disse M., 36 anos. Eu chamo isto de Síndrome de Gabriela com base na música Modinha para Gabriela de Dorival Caymmi. “Eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim, Gabriela”. O último verso ilustra a sensação de que não há nada a ser feito. O que causa esta convicção? A ignorância. Por causa disto, é muito importante divulgarmos ao máximo informações sobre como enfrentar doenças emocionais.
Envie suas dúvidas e perguntas para contato@lenilsonferreira e responderemos em nossa próxima coluna quinzenal neste jornal. Cuide de sua Saúde Mental. Não há saúde sem saúde mental!
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